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Este Flamengo, que ganhou duas taças em um dia, ainda pode ser melhor



 

É natural que o torcedor do Flamengo ainda esteja digerindo a sequência frenética de acontecimentos: os gols de Gabigol no sábado, em Lima; o mar de gente no Centro do Rio no domingo, demonstração de paixão que ajuda a dimensionar o tamanho do feito rubro-negro; a segunda taça num espaço de 23 horas, no mesmo domingo, após a derrota do Palmeiras.

Mas em breve chegará o momento de olhar para a frente. E para um clube que tem em mente um projeto de dominação, será preciso pensar nas próximas etapas. Repete-se exaustivamente que derrotas ensinam, mas vitórias também podem oferecer lições importantes. A forma pela qual o Flamengo bateu o River Plate permite ao menos dois ensinamentos. E ambos tem a ver com respeitar o tempo.

Se o rubro-negro teve que lidar na final da Libertadores com um rival que lhe foi superior por 70 minutos, é porque o jogo escancarava a diferença entre ter cinco meses de trabalho contra ter cinco anos e meio. Havia ideias claras dos dois lados, mas a facilidade de execução, por 70 minutos, era maior do lado argentino. Provavelmente, havia no River de Gallardo mais certeza sobre como o time lidaria com um jogo tão crucial. Já o Flamengo não passara por tal prova. É um time que existe há pouco tempo.

É fato que veio o erro de Lucas Pratto, que as substituições de Gallardo não funcionaram, que as mexidas de Jesus surtiram efeito e que a reserva técnica de talento do Flamengo se provou decisiva no momento crucial do jogo. Toda partida é sujeita a circunstâncias, a imprevistos. E, no fim, eles penderam para o lado rubro-negro, numa diferença tênue entre vitória e derrota. Mas aí chegamos a uma segunda certeza que a final deixou, esta muito animadora quanto ao futuro imediato do Flamengo: este time pode ser muito melhor, ficando menos à mercê das contingências.

A final da Libertadores, justamente ao não exibir um Flamengo espetacular, deixou um recado ao rubro-negro e um alerta aos rivais. Se respeitar o tempo, este Flamengo tem imensa chance de crescer. Ficou nítida a sensação de um time que não atingiu seu teto. E talvez nem pudesse, em apenas cinco meses com Jesus.

Porque parte da diferença que separava Flamengo e River Plate tinha a ver com uma natural disparidade de maturidade coletiva. O que não tem nada a ver com maturidade emocional, mas com a maturação de uma ideia de jogo, um acúmulo de vivências, o saber passar por situações que fogem à rotina. O Flamengo de Jesus chegou a Lima tendo sido testado, quase que exclusivamente, no ambiente doméstico. E no Brasil, é o Flamengo quem impõe sua intensidade e sua pressão aos rivais. Não o contrário.

Juntar uma ótima comissão técnica à maior reunião de jogadores de alto nível que o país viu nos últimos anos quase não foi suficiente em Lima. Se provocou uma ruptura no campo administrativo, o desafio rubro-negro é perseguir a estabilidade esportiva, com manutenção de ideias e de nomes. Não custa lembrar, o 2019 do Flamengo teve, a partir de junho, um novo treinador e quatro novos titulares contratados.

Um passo é obter garantias de Jorge Jesus não sobre o cumprimento do contrato, que vai até o meio de 2020, mas sobre todo o ano. O outro, romper com algo recorrente em países exportadores: evitar um êxodo de jogadores que modifique demais o elenco. As condições financeiras estão postas: a reforma administrativa já fez este dever de casa.

Mas no domingo em que o Flamengo, sem jogar, celebrou duas conquistas, ficou uma lição para o futebol brasileiro. A forma de jogar da equipe de Jesus já sinalizara que é possível vencer de outras formas por aqui. A recusa em negligenciar um torneio, mesmo diante do calendário congestionado, é outro recado importante.

 

Fonte: O Globo

 


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