Alisson foi eleito o melhor goleiro das três principais competições que disputou na temporada: Campeonato Inglês, Champions League e Copa América. Ficou 20 partidas consecutivas sem levar gols na Premier League e se tornou dono do terceiro maior período sem ser vazado na história da competição. Coletivamente, também triunfou, foi vice-campeão nacional e campeão continental no clube e na seleção. Ainda assim, ficou fora da lista dos dez melhores jogadores da Fifa. Que é mais difícil para o futebol reconhecer a qualidade de seus goleiros, todo mundo já sabe, desde que o esporte existe, desde que o primeiro inglês aceitou ficar debaixo da trave para evitar gols em vez de marcá-los. Talvez a mensagem que a entidade esteja mandando com isso seja mais profunda. De que ser nascido na Europa facilite um jogador da posição aparecer entre os melhores.
A história da premiação induz a dois parâmetros. Para surgir entre os três primeiros, é preciso que o goleiro seja destaque em uma Copa do Mundo. Os alemães Oliver Kahn e Manuel Neuer foram segundo e terceiro lugar, respectivamente, depois de serem finalistas no Mundiais de 2002 e 2014. Apenas cinco goleiros foram selecionados em 15 oportunidades entre os dez melhores jogadores do mundo. Peter Schmeichel (três vezes), Kahn (duas), Buffon (quatro), Casillas (quatro) e Neuer (duas) possuem em comum campanhas de destaque nas temporadas em que foram eleitos, mas nem sempre acumularam os mesmos títulos individuais e coletivos que Alisson em 2019. Na verdade, títulos mais relevantes que o brasileiro, somente Buffon, em 2006, Casillas, em 2010, e Neuer em 2014, que foram campeões do mundo por suas seleções. A constatação é óbvia: todos europeus.
O critério que pretere Alisson é uma exclusividade das eleições da Fifa. O mercado do Velho Continente já se rendeu ao talento do goleiro brasileiro. Ao mesmo tempo, reforça o estereótipo eurocentrista. De acordo com o site Transfermarkt, ele é o segundo jogador da posição a movimentar mais dinheiro em uma transferência na história. O Liverpool pagou 62,5 milhões de euros para tirá-lo da Roma, da Itália. Somente o espanhol Kepa foi mais caro, cerca de 80 milhões de euros que o Chelsea pagou ao Athletic Bilbao. A diferença de valores, se for levado em consideração o currículo de cada um, causa estranheza que somente a nacionalidade explica.
Taffarel comenta
Se for o caso, não seria o primeiro brasileiro a passar por isso. Julio César, entre 2006 e 2010, viveu o auge da carreira. Foi pentacampeão italiano numa época em que o futebol do país ainda era protagonista e campeão da Liga dos Campeões, além de ser um dos melhores jogadores da seleção brasileira. Em que pese a falha nas quartas de final da Copa do Mundo de 2010, contra a Holanda, o jogador nunca apareceu entre os dez melhores da posição na visão da Fifa. Dida, no ciclo entre 2002 e 2007, foi bicampeão da Liga dos Campeões e conquistou outros seis títulos pelo Milan no período, além de ser titular da seleção brasileira. Ainda assim, foi ignorado pela eleição da entidade.
O perfil do atual titular da seleção e do Liverpool leva a crer que o fato de ter sido preterido não mexe com sua noite de sono. Alisson é sóbrio nas palavras, nos gestos em campo para defender uma bola,e no comportamento fora dele. Taffarel, seu preparador de goleiros na seleção brasileira, tem certeza de que o jogador manterá o nível de trabalho, com ou sem reconhecimento da Fifa:
– Acredito que ele é o primeiro a não estar preocupado com a ausência de seu nome. Sabemos que para um goleiro estar nessa lista é muito difícil. Só de ser cogitado já deixou o goleiro bastante feliz, comprovando o excelente trabalho que fez, tanto na seleção quanto no Liverpool. Se vier uma futura nomeação, muito bem. Se não, ele vai continuar jogando dessa forma, sendo sempre apontado como um dos melhores do mundo. Acredito que ele esteja pensando dessa forma. Nós, da seleção, estamos muitos satisfeitos e felizes com o desempenho dele.
Fonte: O Globo