Diante de tantos problemas de lesão e às vésperas de uma decisão na Libertadores, era natural que o jogo com o Botafogo tivesse uma importância para o Flamengo que transcendesse a disputa por pontos na tabela do Brasileiro. E, se for tratada como apronto para a partida com o Emelec , a vitória sobre o alvinegro trouxe algumas conclusões.
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Primeiro, Jorge Jesus deixou uma mensagem clara. Por mais que o contexto do futebol brasileiro imponha dificuldades, a forma de enfrentar o Botafogo reafirmou que alguns pilares de seu modelo de jogo são inegociáveis: o time não abre mão da intensidade, da pressão no campo ofensivo, da busca constante pelo ataque, do jogo com linha de defesa adiantada. Nem mesmo num clássico em que o time se apresentou sem quatro titulares importantes, todos lesionados, a lógica mudou. E o jeito de jogar resistiu até mesmo após Rodrigo Caio sair lesionado. O Flamengo manteve sua linha defensiva distante da área, embora jogasse com uma dupla de zaga inédita, formada pelo espanhol Marí e por Thuler.
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Boa notícia para o torcedor do Flamengo foi ver o time voltar a ter um lado direito fortíssimo. A mudança de Gérson para este setor, atuando com “pé invertido”, permitiu ótimas combinações com Rafinha e Gabigol, que constantemente se movia do centro do ataque para o lado. No primeiro gol do Flamengo, Rafinha ultrapassa arrastando a marcação de Luiz Fernando e isola Gérson no duelo pessoal com Jonathan, permitindo o belo gol do ex-jogador do Fluminense. No terceiro, a triangulação termina na infiltração de Rafinha e no gol de Bruno Henrique.
Outro ponto positivo foi o fato de, mesmo com os desfalques, a atuação no clássico ter reafirmado a força do elenco. Jesus encontrou um time competitivo e ofensivamente forte. Não foi raro ver a equipe buscar a conclusão de jogadas com até cinco homens na área. O modelo parece beneficiar muito Gabigol, que vive ótimo momento. E Jesus voltou a executar uma troca de sistemas no decorrer da partida: sempre que se pôs em vantagem, migrou do 4-1-3-2 para o 4-2-3-1, com os dois volantes alinhados. Enquanto teve fôlego, o Flamengo impediu o Botafogo de praticar seu jogo de construção, sufocou a posse de bola rival e dominou amplamente, em especial no primeiro tempo.
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Mas é justamente quando se fala em fôlego que se colocam algumas interrogações para o futuro imediato. Está claro que o modelo de Jorge Jesus exige fisicamente demais do time. E ainda mais agora que o número de peças disponíveis diminuiu, as oscilações de intensidade e no nível de pressão no adversário ficam mais claras. Além disso, as lesões preocupam. Muitos dos desfalques atuais ocorreram por pancadas. No entanto, com as perdas de Rodrigo Caio e Lincoln durante o clássico, o time tem três jogadores se recuperando de problemas musculares.
Tal fato tem a ver com a forma de jogar e pode, também, ter a ver com a forma de treinar. Difícil afirmar. Fato é que Jesus, recém-chegado, só agora vai conhecendo o nível de exigência de cada jogo no futebol brasileiro. Um duelo contra um rival de meio de tabela é mais nivelado do que para um candidato a títulos em diversos países europeus. O drama é que o Flamengo se vê em meio a seguidos jogos decisivos enquanto Jorge Jesus vai se adaptando, conhecendo o terreno em que pisa e notando o quanto as rotações de jogadores podem se mostrar essenciais.
Além das lesões, a oscilação física refletiu na qualidade da atuação do Flamengo diante do Botafogo. No segundo tempo, o time já não pressionava tanto na frente e o alvinegro teve mais espaço para sair trabalhando a bola desde a defesa. E ainda que o rubro-negro fosse claramente melhor time no jogo, o Botafogo teve duas chances boas no início da segunda etapa, com o placar ainda em 1 a 1. Jesus sinalizou no clássico que Trauco pode enfrentar o Emelec, por sua maior capacidade técnica e de criação. Em tese, isto pode gerar algum nível de preocupação defensiva. O fato é que, enquanto esteve fisicamente forte, o Flamengo atuou muito bem sem a bola contra o Botafogo.
O Flamengo que enfrentou o Botafogo parece ter condições de buscar a virada após a derrota no Equador. E ganhou forças no aspecto anímico, com o time saudado pela torcida ao fim do jogo após dias de pressão. Caso se classifique, terá obtido um triunfo simbólico de sua capacidade econômica atual, uma vitória do elenco. Se recuperar ao menos um de seus lesionados, ampliará suas possibilidades.
Fonte: O Globo