O colombiano Reinaldo Rueda tocou em algumas feridas das seleções sul-americanas atuais. Citou o êxodo precoce de jogadores, a perda de identidade e acrescentou que o drama de renovar seleções é ainda maior para países que não são tão populosos. Como o Chile, que dirige. Talvez hoje se encontre um mestre nesta tarefa. Oscar Tabárez treina há 13 anos a seleção de um país de população seis vezes menor do que a chilena. Mantém o Uruguai competitivo e, hoje, às 20h, no Maracanã, no duelo pelo primeiro lugar do Grupo C da Copa América, enfrentará os chilenos com uma mostra de que renovar é possível. Desde que haja um processo.
Rueda buscou novas peças no Chile e não achou tantas. Tanto que iniciou o jogo com o Equador com nove jogadores de 30 anos ou mais. Até o estilo foi afetado. Desde os tempos de Marcelo Bielsa, passando por Jorge Sampaoli e até Juan Antonio Pizzi, o Chile tinha por hábito pressionar os rivais desde a saída de bola. Agora, é mais conservador. Talvez para poupar o físico.
? É um problema de toda a América Latina. As competições locais não dão aos jogadores o amadurecimento suficiente. Logo saem para outras culturas futebolísticas que eles não absorvem tão rápido ? disse Rueda.
O Chile tem quase 19 milhões de habitantes. Então, o que dizer do Uruguai, com seus estimados 3,5 milhões? Nem sempre foi fácil. O time atual tem jogadores como Suárez, Cavani, Godín e Cáceres que vão para o quarto ciclo de Copa do Mundo ? estavam no Mundial de 2010, na África do Sul. Em 2014, no Brasil, verificou-se uma certa saturação do estilo e uma necessidade de arejar a seleção. Na Rússia, novos ventos começaram a soprar.
Meio-campo jovem e oriundo de grandes clubes da Europa
Hoje, Tabárez pode lançar mão de um meio-campo com Nández, de 24 anos; Torreira, de 23; e Bentancur de 22. Torreira deve ser desfalque e daria lugar ao rubro-negro Arrascaeta, de 25, ou a Valverde, de 21. Torreira, do Arsenal, Bentancur, da Juventus, e Valverde, do Real Madrid, estão em grandes clubes da Europa.
O segredo está numa nova lógica que Tabárez implantou: devolver identidade à seleção através da aposta inegociável na base. A ideia era transformar a seleção principal no resultado de um processo iniciado nos juvenis. De forma que vestir a camisa celeste não fosse uma experiência pouco familiar. Do grupo atual, 19 dos 23 convocados passaram pela formação.
? O tesouro do futebol uruguaio é o futebol infantil. A cada fim de semana, congrega 300 mil pessoas entre jogadores, familiares, treinadores ? conta Tabárez, que acompanha de perto o trabalho com os jovens.
Não se trata só de unificar táticas. A ideia do “Maestro?, como é conhecido, é também uma revisão de valores antes associados ao futebol uruguaio.
? Nos anos 20 ou 30, junto com os argentinos, jogávamos o melhor futebol do mundo. Neste fio condutor veio 1950 e, mais à frente, algo se perdeu no caminho. Éramos identificados como animais, associados ao jogo brusco. Com alguma justiça, mas um pouco exageradamente? disse. ? Não ganhamos tanto, mas frequentamos mundiais, competimos, ganhamos Copa América. E mudamos valores.
Fonte: O Globo