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Futebol feminino aposta em visibilidade de torneios para se firmar no Brasil



Desde 2015, Juliana defende o Flamengo no Campeonato Brasileiro feminino de futebol. Domingo, a meio-campo de 27 anos estará em mais uma estreia do time, único do Rio na Série A1 (primeira divisão), contra o Iranduba, em Manaus ? o torneio começa neste sábado, com três partidas. Desta vez, porém, a carioca sente que os olhares para a modalidade no país estão diferentes. A CBF fechou parceria com o Twitter, que irá transmitir os jogos na sua plataforma, há negociação em curso para transmissão das partidas numa emissora de TV aberta, apoio logístico total da entidade e cotas para todos os times. O número de atletas profissionalizadas também cresceu de 30 para 200, com expectativa de 600 até o fim da temporada.

O momento atual, ela acredita, é para ser agarrado com unhas e dentes. É o ano em que a Copa do Mundo da categoria será transmitida na TV aberta pela primeira vez. O Brasil tem a grande estrela do evento, a seis vezes melhor do mundo Marta. E a CBF e a Conmebol vincularam a participação dos times masculinos em suas competições à formação de equipes femininas profissionais e de base.

? Esse ano promete pela grande visibilidade que o futebol feminino vai ter. É muito importante para a gente que as pessoas possam ver os jogos ? diz Juliana, presente na última convocação da seleção brasileira.

Além da maior projeção da competição, os clubes tradicionais, obrigados a investir na categoria pelas entidades, percebem novas oportunidades de negócios e investimentos.

? Acho que é o melhor momento do futebol feminino do Brasil na história. Eu enxergo uma mudança de abordagem. Os clubes já veem como investimento, como oportunidade de receita, de marketing ? analisa o diretor de competições da CBF, Manoel Flores. ? São 3 mil ingressos antecipados para Iranduba x Flamengo, há lançamentos de camisa, anúncios de atletas, como o São Paulo fez com a Cristiane. Então, é uma outra pegada.

R$ 185 MIL PARA O CAMPEÃO

A vida no futebol feminino no Brasil está longe de ser a dos sonhos. Os valores de salários e premiações, se comparados com o universo masculino, são ínfimos.

No Brasileiro de 2018, o time masculino do Palmeiras, por exemplo, recebeu R$ 18 milhões. O Corinthians, campeão feminino, ficou com R$ 120 mil, menos de 1% do prêmio pago aos homens. Na Libertadores, a diferença se mantém. Ano passado, foram R$ 35 milhões para os campeões e R$ 206 mil para as campeãs.

Para este ano, a CBF pagará valor igual em cota de participação. No total, serão distribuídos R$ 700 mil. Além disso, em auxílios aos clubes serão pagos R$ 10 mil por jogo aos mandantes e R$ 5 mil aos visitantes. Ao todo, a entidade desembolsará R$ 2,01 milhões. Somando as premiações de cada fase, o campeão levará R$ 185 mil.

? A competição está paga, passagens, hospedagens, arbitragem. Além disso, tem um auxílio para pagar ambulância, maqueiro, etc. E ainda tem as cotas dos avanços por fase. Financeiramente, a competição é muito boa. Não compare com masculino. Para o feminino, é um dinheiro interessante. Nos próximos três anos, é consolidar isso aí. Agora, tem que vender, números para o ano que vem, começar a dar retorno financeiro para os clubes ? afirma Flores.

EXEMPLO NO EXTERIOR

Com a experiência de um ano em Bath, na Inglaterra, em 2011, Juliana consegue traçar as principais diferenças do Brasil e principais centros.

O nível de profissionalização e o investimento na base, segundo ela, são os grandes empecilhos para o desenvolvimento do futebol feminino no Brasil. E, consequentemente, afeta a renovação da seleção brasileira, que ainda se apoia em Marta, Formiga e Cristiane.

Lá, ela tinha casa, tradutor, professora de inglês. Não se preocupava com nada além de jogar bola num clube da terceira divisão. Só retornou porque a avó ficou muito doente.

? Aqui, no início, eu já tive de jogar com várias meias porque a chuteira emprestada era dois números maior ? conta Juliana, que começou a levar o futebol a sério aos 13 anos, quando conseguiu uma bolsa de estudos em um colégio de Jacarepaguá.

Ela aponta as dificuldades do crescimento regional do esporte. A falta de estrutura do Carioca, por exemplo, leva a casos bizarros. Certa vez, o Flamengo viajou até a Região dos Lagos,mas não pôde jogar porque a taxa de arbitragem não havia sido paga.

Atleta da Marinha há seis anos, ela não reclama das condições atuais. Tem um salário fixo, que paga as contas de casa, na Cidade de Deus, e as necessidades mais básicas. Mas nunca foi o suficiente para investir em nutricionistas e outros cuidados necessários para uma atleta de alto rendimento. Por isso, quer voltar para o exterior ao fim da temporada.

Do Flamengo, o time recebe o material de treino e de jogos, o que é um dos questionamentos constantes das jogadoras. Desde o ano passado, elas treinam e atuam com versões antigas fabricadas pela Adidas. Os patrocínios antigos são cobertos por tarjas ao longo dos uniformes, já que a equipe feminina não recebeu o de 2019. Ano passado elas jogavam com o de 2016. (Colaborou Diogo Dantas)

Fonte: O Globo


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