Chamar a atenção apenas para a boa participação das caras novas testadas por Tite na virada da seleção brasileira sobre a Venezuela é reforçar que o trabalho desenvolvido até aqui vive de resultados, não de ideias consolidadas. A invencibilidade mantida nas Eliminatórias é fato, mas também é enganosa, pois não permite uma análise tão crítica quanto deveria haver.

Dito isso, pode-se atribuir o mau desempenho, especialmente no primeiro tempo, antes da virada por 3 a 1, a uma mistura de atuações pouco interessadas de alguns jogadores, talvez desgastados, sobretudo os que atuam no Brasil de calendário insano. Entretanto, os desfalques de Casemiro e Neymar são muito pouco para explicar a pobreza técnica, tática e motivacional.

O líder das Eliminatórias com100% de aproveitamento é também o time que sucumbe a uma marcação pressão do vice-lanterna. Que não consegue encontrar espaços diante de uma linha defensiva bem compacta. Que por vezes não consegue competir. E a pouco mais de um ano para a Copa do Mundo isso deveria preocupar.

Sem adversários mais fortes como parâmetro, é no embate diante de equipes sul-americanas minimamente aguerridas que se nota a falta de dominância e consistência do Brasil. Um time que aceita passivamente o relógio correr. Que não acelera suas ações, talvez porque não tenha tanta convicção sobre o que deve executar. Foi essa a sensação deixada.

E aí, cabem ponderações individuais. Gerson foi mantido como titular depois de passar por um período conturbado na França. Perseguido por colegas do Olympique, cobrado pela torcida, claramente não está nos melhores dias. Sem o seu poder de distribuir o jogo, de avançar com força ao ataque, o Brasil foi lento e previsível.

A saída pelas laterais com Danilo e Arana também foi bem bloqueada pela Venezuela. O Brasil só tinha poder de criação com Paquetá e Éverton Ribeiro por dentro. O primeiro, em boa fase na Europa, esteve sobrecarregado, e produziu pouco. Tanto que acabou saindo.

O meia do Flamengo, desgastado pelo calendário, apareceu por vezes do lado direito e outras do lado esquerdo. Tentou não ocupar o mesmo espaço que Gabriel Jesus. Mas as jogadas por alli não fluíram, o que obrihou Ribeiro a ficar mais encaixotado entre as linhas de defesa. Deixou o campo no intervalo.

Gabriel Jesus também não se entendeu com Gabigol. Tudo bem que os dois atacantes foram pouco abastecidos, mas poderiam ter se procurado mais, tentado alguma tabela. A situação só melhorou para o atacante do Flamengo quando Tite tirou Jesus e abriu mais o time com Raphina, Antony e Vinicius Junior. Com mais espaço, Gabi cresceu. Também ganhou o voto de confiança de Tite para atuar o jogo todo, e marcou de pênalti.

A solução de mandar a campo quatro atacantes e tirar dois meias deixa claro que Tite não conseguiu preparar soluções suficientes para vencer a Venezuela com o time idealizado. E que esta seleção ainda enfrenta as dificuldades que o treinador mesmo apontou na criação de jogadas. Não há construção do jogo desde a defesa com o dinamismo esperado. Há carregadores de bola até certa altura e trocas de passes intuitivas de bons jogadores.

É aí que entra o fator Neymar. Até que ponto sua ausência reforça que a seleção está em um estágio inferior ao que deveria? Fato é que as novas soluções têm aparecido, antes tarde do que nunca. Raphinha entrou muito bem e foi responsável por duas assistências. Antony deu o dinamismo e a velocidade esperadas ao ataque. E até Vinicius Junior conseguiu jogar com os espaços decorrentes de um jogo mais franco e aberto quando o Brasil já havia empatado em bola parada com Marquinhos.

Foram 12 finalizações contra 9 da Venezuela. Pouco diante da qualidade do adversário. E menos ainda se projetarmos que pela frente teremos Colômbia e Uruguai. O que dirá contra um europeu de primeira prateleira. Tite segue a perseguição por seu time ideal e por um ideal de jogo que encaixe e seja definitivo.