Responsáveis por um dos melhores jogos da Copa de 2018, Brasil e Bélgica entram em campo nesta quinta-feira. A seleção de Tite, derrotada nas quartas de final em Kazan, enfrentará a Venezuela, às 20h30, em Caracas, em novo jogo protocolar até a conquista da vaga no próximo Mundial. Já os belgas pegarão a França, atual campeã do mundo, na semifinal da Ligas das Nações da Uefa. Se vencerem, disputarão o título contra a Espanha, que derrotou ontem a Itália.

A diferença entre o nível dos adversários mostra como os pentacampeões fazem um voo cego até a Copa do Qatar, marcada para novembro de 2022. Nunca antes a seleção foi alijada de competir com os europeus, praticamente sem espaços no calendário para amistosos depois da criação da Liga das Nações. O Brasil fez apenas um jogo até agora no ciclo diante de um adversário do Velho Mundo, contra a República Tcheca, em 2019, e no melhor e mais improvável dos cenários, pode fazer até mais seis.

O ex-lateral-direito Jorginho, atual treinador do Cuiabá, viveu três ciclos preparatórios para Copas, dois como jogador, um como auxiliar. Entre 1990 e 1994, fazia parte do elenco que disputou 13 partidas contra europeus antes do Mundial dos EUA, onde o Brasil foi tetra. Entre 2006 e 2010, foi o braço-direito de Dunga, que enfrentou 14 seleções da Europa antes da Copa na África do Sul.

? A falta de jogos contra europeus atrapalha muito o planejamento. A troca de informações é fundamental. Independente se tem a maioria dos jogadores na Europa, é diferente jogar na seleção e no clube. O sistema de jogo é diferente, a metodologia de trabalho. É um problema ? afirmou Jorginho.

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Técnica e altura

O treinador da seleção sabe disso. Mês passado, fez um apelo público ao coordenador Juninho Paulista e ao presidente Ednaldo Rodrigues para que a CBF consiga amistosos contra seleções europeias antes do próximo Mundial. Chegou a dizer que qualquer adversário do Velho Continente serve. Mas existem preferências. Internamente, a entidade tenta agendar amistosos contra seleções de nível mais elevado, como a própria Bélgica, algoz na Rússia. Outro desejo é enfrentar seleções de grande estatura, que imponham dificuldades no choque físico e no jogo aéreo. A título de comparação, os suecos, um dos rivais possíveis, têm elenco com média de estatura de 1,85m. Os venezuelanos, adversários hoje, medem em média 1,80m.

Se o Brasil vencer em Caracas, chegará a nove vitórias em nove jogos nas Eliminatórias e poderá abrir 16 pontos do Paraguai, primeira seleção fora da zona de classificação para o Qatar. Mas, no caso da equipe, os números dizem muito menos do que as atuações em campo. As dificuldades que o time têm enfrentado e a derrota para a Argentina na final da Copa América ajudaram a reforçar a sensação de que pouco adianta a campanha invicta se os adversários são muito inferiores aos melhores do mundo. A Venezuela tem apenas quatro pontos nas Eliminatórias, com uma vitória. A sensação em torno da “Vino Tinto” é de retrocesso depois de a seleção dar sinais de evolução com a chegada da geração vice-campeã mundial sub-20. O técnico Leonardo González está interinamente no cargo, desde que o português José Peseiro pediu demissão, alegando atraso no pagamento dos salários.

? Não pode ter como parâmetro enfrentar sul-americano, a hegemonia é muito grande aqui ? afirmou o comentarista Júnior: ? Isso pode ter influência na hora de enfrentar europeus. O importante, apesar de ter jogadores que atuam lá na Europa, é ter mais de um plano de jogo definido. É jogar de um jeito que, se não der certo, tenha um plano B.

Gabriel + Gabriel

Em seu primeiro ciclo com a seleção, Tite viveu sequência de ótimos resultados e atuações até que viajou para fazer em Londres seu primeiro jogo contra um adversário europeu, em novembro de 2017. Empatou em 0 a 0 com a Inglaterra em um confronto que tirou o sono do treinador pelos meses seguintes, até a Copa da Rússia: ao se defender com uma linha de cinco, os ingleses neutralizaram muito do poderio ofensivo que o Brasil vinha mostrando contra os vizinhos sul-americanos e empolgando a torcida.

Depois do jogo em Wembley, ainda teve outros quatro amistosos contra europeus até o Mundial. No ciclo atual, Tite terá até seis datas para amistosos após as Eliminatórias, sem levar em consideração o jogo suspenso contra a Argentina, ainda sem dia para ser realizado ? a definição será da Fifa. A ideia da CBF é disputar pelo menos três amistosos contra europeus no período entre as Eliminatórias e a Copa do Qatar. Cabe a Tite cruzar os dedos para que tão pouco seja suficiente.

? Os danos dessa falta de intercâmbio, e consequente desinserção do grande sistema do futebol, é o empobrecimento sistemático das nossas instituições futebolísticas ? afirmou o comentarista Paulo Calçade. ? Os danos à seleção são imensos. Difícil imaginar quando um país sul-americano voltará a vencer o Mundial. Não temos organização na América do Sul para que o bloco evolua. Enquanto isso, a Europa avança, ocupando todas as datas do calendário. Eles se garantem, precisam menos do futebol sul-americano do que nós deles.

Para a partida desta quinta-feira, o treinador, sem Neymar, suspenso, escalará o ataque com Gabriel Jesus e Gabigol. Fabinho será titular no lugar de Casemiro, cortado. Na lateral esquerda, Guilherme Arana fará sua estreia pela seleção principal.