No corredor do supermercado, Chay e sua mãe notaram algo estranho. Um desconhecido os seguia e olhava insistentemente para ele. Ficaram assustados. Temeram ser assalto ou até discriminação racial. Até que o homem se aproximou. Era um torcedor do Botafogo que, ao confirmar se tratar do jogador, pediu uma foto. A maioria dos atletas de clubes grandes já está acostumada com a abordagem. Mas, até quatro meses atrás, o meia de 30 anos nunca havia defendido um time popular.

? Ali caiu a ficha de que a coisa estava grande ? recorda-se Chay ao GLOBO.

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Em 21 jogos pelo Botafogo, ele contabiliza sete gols e quatro assistências. Virou destaque do time na Série B e levou a diretoria a adquirir seus direitos em definitivo ? havia chegado por empréstimo da Portuguesa-RJ. Mais: passou a ser tietado nas ruas e seguido nas redes sociais. Mas só neste domingo, contra o Sampaio Corrêa, às 18h15, viverá a experiência de jogar diante dos alvinegros.

? Espero que venham incentivar o Botafogo. Sempre digo que ele vem em primeiro lugar. Mas vou ficar muito feliz se gritarem meu nome e cantarem música. É um momento muito marcante na minha carreira.

 

O jogo de hoje será o primeiro do clube com presença de torcedor no Nilton Santos. Foram postos à venda 4.999 ingressos. Para entrar no estádio, é preciso apresentar exame negativo de teste antígeno contra Covid-19 e comprovante de vacinação em dia.

? É sempre gostoso estar diante de torcida. A gente já teve a experiência com o CSA, fora de casa. Entrei em campo e comentei com o Kanu: ?Cara, que gostoso. Torcida faz parte do futebol, estava faltando?. E agora vamos viver isso em casa.

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Mesmo sem poder frequentar os jogos, a torcida continuou criando músicas. E Chayene ? seu nome é inspirado no personagem Cheyenne, do western “Era uma vez no Oeste? ? já ganhou uma só para si. “Pai, eu vi o Chay?, paródia de “I will survive? virou hit entre os alvinegros comparando o meia a Henry, Ronaldo e Messi.

? É engraçada. Cita grandes ídolos do futebol. Comparações que acho bem… Como posso dizer? Que não dá nem para imaginar! Ronaldo, Messi e Henry são referências. Levo para o lado cômico mesmo.

 

A identificação com o Botafogo é tanta que até a superstição ele leva consigo. O número 14 foi escolhido a dedo. Vem de uma de suas maiores inspirações: o mesmo Henry com o qual é comparado na música.

? Tudo o que envolve número eu escolho ele. Até para rifa. A prova (de que traz sorte) é que o escolhi no Botafogo e nem esperava que as coisas fossem andar tão rápido.

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A popularidade adquirida em quatro meses pode ser medida em números. Assíduo nas redes sociais, Chay acompanha o crescimento dos seguidores. Ao deixar a Portuguesa, pela qual foi parar na seleção dos melhores do Carioca 2021, o meia contabilizava 15 mil seguidores no Instagram. Hoje, são 56,7 mil. No Twitter, o número saltou de 800 para 22,7 mil.

? Hoje não dá mais acompanhar todas as mensagens que recebo. Sempre procuro me desculpar, porque as pessoas pedem vídeo, mensagem de aniversário e não consigo mandar para todos ? conta. ? Tento criar uma proximidade com o torcedor. Mostrar que somos pessoas normais, que jogador de futebol não é intocável.

A fama tardia o estimula, mas não o deslumbra. Embora Chay tenha se tornado popular agora, sua caminhada é longa. Na base, ouviu muitos ?não?. Inclusive de Flamengo e Fluminense. A profissionalização veio no modesto Bonsucesso.

O mesmo futebol que o permitiu conhecer países como a Tailândia e a Malásia também o levou aos grotões das divisões de acesso do futebol carioca e paulista. Conviveu não só com salários atrasados e pagamentos que mais pareciam ajuda de custo como sofreu com a falta de estrutura: derrota por W.O. porque o clube não providenciou viatura da polícia e treinos em campos de society por falta de local.

? Era suado, mas a força de vontade dos atletas em vencer e mudar de vida foi mais forte que as dificuldades.

A falta de perspectiva o levou ao futebol de 7. E o que era para ser um complemento de renda cresceu. Chay defendeu Fla, Flu, Bota e a seleção, pela qual foi campeão do mundo e da América em 2018. Mas a perda de força da modalidade e uma nova chance o recolocaram nos gramados. De onde não quer mais sair.

? Cheguei aqui e não quero regredir. Porque só eu sei o que passei. Sou grato a todo torcedor que consegue identificar essa alegria que tenho em jogar futebol. Alimenta minha força de vontade. Mas não muda meu modo de ser como pessoa. Espero trazer alegria para o torcedor, mas sempre com os pés no chão.