A pouco mais de um ano da Copa do Mundo no Qatar, independentemente do nível de compreensão do jogo e de interesse no futebol de seleções, está claro que o Brasil de Tite não joga bem. Ele próprio, cuja posição e trabalho são mais complexos do que a enorme maioria das pessoas está disposta a entender, certamente é o primeiro a reconhecer os defeitos no funcionamento da equipe e o principal interessado em solucioná-los. O momento é especialmente desafiador para um treinador seguro de suas convicções e pouco afeito a alterações de rota durante a construção de seus times, mas a combinação entre a proximidade do Mundial e a escassez de tempo disponível para ajustar a seleção pedem, ao que tudo indica, uma decisão que considere mais riscos.

Se Tite quiser seguir investindo no ataque posicional com o qual o Brasil se instala no campo do adversário em 2-3-5, com os dois zagueiros situados na região do meio de campo e por vezes trabalhando na intermediária do rival, talvez seja conveniente procurar outro tipo de defensor. Atenção: isto não é uma crítica aos zagueiros normalmente convocados, todos muito bons. A questão são as características e os papéis. Para superar os chamados blocos baixos, frequentemente com cinco jogadores defendendo na primeira linha, é preciso ter zagueiros com perfil de meio-campistas (ou meio-campistas convertidos em zagueiros). Essas duas figuras são as responsáveis por identificar como entrar na defesa oponente e devem ser capazes de executar os movimentos para tanto. Ter bom passe não é suficiente, pois só um envolvimento maior pode mitigar a desvantagem numérica de 8 contra 11. O Brasil possui esses zagueiros? É viável usar meio-campistas na função?

De outra forma, se a ideia for uma equipe que atrai o adversário para seu campo e explora o espaço, Tite poderia acrescentar um zagueiro. Este cenário lidaria com alguns obstáculos. Um deles seria a repercussão da decisão de, seguindo uma tendência mundial, criar um time que alterne entre a linha de 3 zagueiros com a bola e 5 no momento defensivo, como se algo assim fosse constrangedor para a seleção brasileira. Um outro é a predileção de Tite por trabalhar com 4 defensores, “chassis? da seleção desde que ele assumiu. É evidente, porém, que os zagueiros que compõem a equipe são plenamente capazes de atuar num trio de excelência sob qualquer aspecto, além do óbvio benefício da presença de alas mais próximos aos atacantes, como forma de solucionar a carência de jogo no meio de campo da equipe atual.

Há uma terceira hipótese que, esta sim, envolveria uma dose extrema de risco: recuperar o modelo de jogo de 2016/17, com o qual a seleção viveu seu melhor período em muitos anos e poderia ter alcançado a final da Copa do Mundo da Rússia. Este é um dos grandes dilemas do trabalho de Tite, pois jogadores cruciais durante as Eliminatórias estavam ausentes ou lesionados na Copa, o que obrigou a comissão técnica a fazer modificações indesejadas. Um ciclo mais tarde, não há como escapar: seria necessário reconduzir Renato Augusto e Philippe Coutinho às funções que cumpriam, e crer que Daniel Alves poderia chegar ao Qatar na melhor forma. O outro lateral provavelmente seria Guilherme Arana.