O derivado mais conhecido do cacau é o chocolate. Mas, no Brasil, também rendeu outros frutos. Como o sucesso da canoagem de velocidade. É graças a ele que a modalidade ganhou o sotaque baiano praticamente hegemônico da seleção atual. E que tem em Isaquias Queiroz seu representante mais ilustre. Nesta quinta, ele venceu sua bateria e garantiu vaga na semifinal do C1 1.000m, marcada para as 21h44 desta sexta. Jacky Godmann foi eliminado nas quartas de final.

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Isaquias é nascido em Ubaitaba. Jacky, é de Itacaré. Erlon Souza, medalhista na Rio-2016 e que não competiu este ano porque se recupera de uma lesão no fêmur, é de Ubatã. Considerando as seleções principais e de base, que treinam em Lagoa Santa-MG e em Capitólio-MG, 11 atletas são baianos, o que corresponde a cerca de 90% da canoagem de velocidade.

 

Eles são do Sul do Estado, que ao longo das últimas décadas se converteu num polo de canoagem. Influência do hábito arraigado na população de usar a canoa nativa como meio de transporte tanto de pessoas quanto da produção de cacau pelo Rio de Contas.

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No trecho que passa por Ubaitaba, ele é marcado pelas águas calmas, o que favoreceu a prática de competições. São os chamados festivais da canoa, que já nos anos 1980 mobilizaram moradores das cidades ribeirinhas e também de Salvador.

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É neste contexto que nasceu, em 1985, a Associação Cacaueira de Canoagem (ACC), formada por um grupo de amigos de Ubaitaba interessados em organizar eventos e torneios locais praticados de forma amadora. Esqueça a canoa olímpica. As embarcações usadas eram os chamados “surfinhos?, caiaques usados para passeio ou turismo.

 

Os campeonatos mobilizaram não só Ubaitaba como as cidades mais próximas. E deram início a uma rivalidade local em torno de qual delas tinha os canoístas mais velozes do Rio de Contas. O burburinho chegou aos ouvidos de Ronilson Sales, atleta de Salvador que provocou uma mudança de rumos.

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Com um caiaque K1 olímpico, o soteropolitano passou a dominar as provas. Com a honra ferida ? e a curiosidade aguçada ? o ubaitabense Jefferson Lacerda procurou se informar melhor sobre os tipos de técnicas e de embarcações.

? Era com se estivéssemos numa bicicleta e ele numa moto. Vai ganhar como? ? questiona Lacerda. ? Mas foi bom, nos estimulou a comprar os barcos. Fizemos um grupo de dez e compramos barcos usados, nas mãos dos outros, em forma de consórcio. Se custava R$ 1 mil, cada um dava R$ 100 e realizávamos um sorteio para ver de quem era o barco. E assim foi ao longo dos meses.

Os canoístas da Associação Cacaueira de Canoagem nos anos 1990 Foto: Arquivo pessoal/Jefferson Lacerda
Os canoístas da Associação Cacaueira de Canoagem nos anos 1990 Foto: Arquivo pessoal/Jefferson Lacerda

 

Lacerda, que sempre transitou entre os diferentes esportes, se empolgou com a canoagem. Dedicou-se a prática e, nos Jogos de Barcelona-1992, tornou-se o primeiro canoísta olímpico do Brasil. Posteriormente, foi treinador em Ubaitaba, onde trabalhou com Isaquias, e também da seleção brasileira.

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Assim como ele, a canoagem baiana cresceu. Com o decorrer dos anos, Itacaré, Ubatã e Maraú acompanharam Ubaitaba e criaram suas associações. Com os programas de incentivo à prática esportiva entre jovens, como o Segundo Tempo, do Governo Federal, nos anos 2000, e apoios do Estado da Bahia e de prefeituras locais, estas entidades se consolidaram como formadoras.

? O Isaquias e o Erlon saíram do Segundo Tempo na segunda metade dos anos 2000 ? conta Camila Lima, presidente da Federação Baiana de Canoagem. ? E hoje estamos executando em parceria com a ACC e o governo do estado o projeto Remando no Litoral Sul, que abrange quatro cidades e atende 90 atletas de 8 a 18 anos em cada núcleo.

Isaquias (à direita, atrás da pasta azul), ainda criança participando dos treinos na ACC Foto: Arquivo pessoal/Jefferson Lacerda
Isaquias (à direita, atrás da pasta azul), ainda criança participando dos treinos na ACC Foto: Arquivo pessoal/Jefferson Lacerda

A região sofria com infraestrutura precária quando Isaquias conquistou três medalhas em 2016. Agora, tem dois centros de treinamento (Itacaré e Ubaitaba). O terceiro, em Ubatã, está a caminho. O governo do estado ainda prometeu a criação de dois núcleos de canoagem (cujas estruturas são mais simples) em Maraú e Camamu.

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O próximo desafio são as mulheres. A equiparação de provas entre gêneros nos Jogos foi alcançado em Tóquio (antes, elas só competiam no caiaque). Mas as brasileiras não conseguiram vaga na canoagem de velocidade.

? Por muito tempo escutamos que mulheres não poderiam praticar na canoa porque poderiam ficar inférteis. Sofremos muito preconceito ? lamenta Luciana Costa, presidente da ACC e segunda vice da Confederação Brasileira de Canoagem. ? Acreditamos que em Paris estaremos com o país representado na canoa feminina. O ciclo vai ser voltado com esse pensamento, de conquistarmos o máximo de vagas possíveis.