Três das quatro seleções que entrarão em campo neste sábado pelas quartas de final da Eurocopa possuem ao menos um ponto em comum: o uso dos três zagueiros. A Inglaterra lança mão deste recurso eventualmente. Foi assim na vitória sobre a Alemanha (que também joga com um trio de defensores), pelas oitavas. Já a Ucrânia, sua adversária às 16h (de Brasília), atua sempre desta forma. Assim como a Dinamarca, que às 13h (de Brasília) enfrenta a República Tcheca.

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Esta formação tem marcado presença significativa no torneio. Assim como na última temporada de clubes europeus. Uma popularidade crescente que começa a chegar ao Brasil, a despeito da resistência histórica que ela sofre por aqui.

Ao se falar de três zagueiros é preciso ter em mente, antes de tudo, que não se trata de sinônimo de esquema defensivo. Em muitos casos, ele permite o oposto. Libera os times para chegar com mais homens na frente.

? Como estes três zagueiros avançam bastante, os dois laterais do sistema viram pontas. E os times passam a jogar até com quatro ou cinco homens na linha de ataque ? explica Leonardo Miranda, autor do blog Painel Tático, do site ge. ? Na frente você tem um primeiro volante e os quatro mais avançados, além dos dois laterais. É um sistema que deixou o jogo até mais ofensivo. Vamos olhar para a Bélgica. Você tem (na frente) o Lukaku, o Mertens, os Hazard (Thorgan e Eden) e o De Bruyne. Quase todo são meias mais criativos. E tem só Witsel como primeiro volante.

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Esta quantidade de homens na linha de ataque só é possível pela mudança na forma de se olhar para os zagueiros. Além da marcação, são mais exigidos no início da construção das jogadas. Uma função que tradicionalmente ficava com o primeiro volante. Com isso, passaram a avançar mais.

? O zagueiro começou a jogar melhor com a bola no pé ? opina Miranda. ? Há um estigma muito grande no Brasil de que zagueiros não sabem jogar. Mas veja o Rodrigo Caio. É quase um armador no Flamengo. Olha o Gustavo Gómez no Palmeiras. Ele dá passe para o Luiz Adriano. Não faz nenhum sentido achar que um time é mais ou menos defensivo por causa da quantidade de zagueiros. Hoje eles têm uma capacidade de dar passes enorme.

O poder ofensivo das equipes que jogam com três zagueiros se reflete nos números. No último Campeonato Italiano, os dois melhores ataques foram de times que atuam neste esquema: a Atalanta (90 gols) e a campeã Inter de Milão (89). Na Espanha, o Barcelona conquistou a Copa do Rei e terminou a Liga como a equipe mais goleadora: 85.

Exemplos de quem faz uso constante ou eventual desta formação não faltam. Entre eles, Real Madrid, Leicester, que ganhou a Copa da Inglaterra, e o Chelsea, atual campeão da Liga dos Campeões anulando o poderoso Manchester City.

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Claro que o sistema também traz benefícios atrás. O primeiro é deixar o time mais protegido quando perde a bola. Com três na contenção, os demais têm mais tempo para ou fazer marcação adiantada ou voltarem às posições defensivas.

Além disso, permite a formação de uma linha de cinco atrás. Afinal, apenas com quatro (os dois zagueiros e os dois laterais) as defesas ficam mais vulneráveis diante de rivais que usam seus alas ou os pontas para explorar a largura do campo. Esta estratégia ofensiva ganhou popularidade com o Barcelona de Guardiola e, atualmente, é muito adotada não só na Europa como no Brasil. Ou seja: o esquema hoje consagrado por Chelsea, Atalanta e Inter de Milão desponta justamente como antídoto contra ela.

? A história do futebol é quase toda de ação que gera uma reação ? resume Carlos Eduardo Mansur, colunista do GLOBO e comentarista do Sportv.

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No Brasil, as zagas com três também são vistas. Palmeiras, São Paulo, Fortaleza e Athletico são seus principais adeptos. Não é coincidência o fato de serem todos treinados por estrangeiros. No país, o recurso ainda é visto com maus olhos.

Por aqui, trios defensivos evocam o São Paulo tricampeão brasileiro (2006/07/08) e o Brasil de 2002. Equipes nas quais, diferentemente do que ocorre hoje, os zagueiros cumpriam unicamente a função de marcar. Por isso, são lembradas com ressalvas apesar de vitoriosas. Para Mansur, a explicação vem da seleção de 1990.

? Foi a pior campanha do Brasil na história recente. Isso deixou muita marca. E às vezes temos o hábito de condenar a ideia, não sua execução. Não é a ideia que foi um erro conceitual. Você pode aplicá-la mal ou bem.