Romelu Lukaku tinha apenas 15 anos quando recebeu ligações de diversos clubes franceses. Por ter um físico avantajado, também despertou interesse da seleção francesa, que estudava a sua naturalização. Isso não agradou à Federação Belga, que percebeu que deveria mudar a sua forma de pensar futebol se quisesse manter seus talentos. Mudou. E com talento e investimento, criou a geração que é uma das favoritas ao título da Eurocopa.

 

Mas Lukaku iniciará a caminhada rumo ao título inédito longe de seus principais companheiros. Neste sábado, às 16h (de Brasília) a Bélgica enfrenta a Rússia, em São Petersburgo, sem o meia Kevin De Bruyne, que ainda se recupera de uma cirurgia para corriger as múltiplas fraturas no rosto sofridas na final da Champions. Vice-campeão europeu e eleito melhor jogador da Premier League ? da qual foi campeão com o Manchester City, o meia segue com muito inchaço no local da lesão, não viajou com o elenco e fará trabalhos de recuperação específicos.

? Os próximos dois dias serão bem importantes para tê-lo de volta, para que possa se movimentar livremente e comece a fazer os exercícios necessários para poder voltar ao grupo ? avaliou o técnico Roberto Martínez.

Hazard esteve em campo contra a Croácia Foto: YVES HERMAN / REUTERS
Hazard esteve em campo contra a Croácia Foto: YVES HERMAN / REUTERS

 

Outra estrela da equipe em baixa é Eden Hazard. Batalhando contra as lesões e com poucas atuações na temporada, o camisa 7 do Real Madrid, um dos principais jogadores daquela equipe carrasca do Brasil em 2018, segue tentando recuperar seu espaço. Ainda frágil fisicamente, o jogador voltou a atuar pela seleção depois de mais de um ano e meio no último dia 6, quando esteve em campo nos últimos oito minutos da vitória por 1 a 0 sobre a Croácia. A tendência é que Eden seja opção para o banco.

 

Vice-artilheiro e campeão italiano com a Inter, Lukaku não será força solitária no time da Bélgica. A equipe não é chamada de “geração” à toa, e jogadores como o ponta Carrasco, destaque do Atletico de Madrid campeão espanhol, e Dries Mertens, atacante móvel e goleador do Napoli, são as principais opções para compor o setor ofensivo belga. Para chegar a esse leque de probabilidades em seu time principal, a federaçao apostou no longo prazo, há duas décadas.

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Projeto de longo prazo

A ideia do projeto de reformulação teve início em 2000, logo após a disputa da Eurocopa daquele ano, sediada na Bélgica. A campanha decepcionante, que terminou com eliminação na primeira fase, foi o primeiro motivo que levou à mudanças. O ápice veio anos depois, quando a seleção belga não se classificou para as Copas do Mundo de 2006 e 2010, além de não disputar nenhuma edição de Eurocopa neste período.

Michel Sablon, atual diretor técnico da seleção, e Bob Browayes, gerente de desenvolvimento da federação belga, viajaram pelo mundo e observaram três modelos distintos de academias de futebol: o alemão, o francês e o holandês. Foi realizada uma reunião entre a federação, os clubes e as universidades de futebol do país para definir quais mudanças seriam feitas. Mais de 1.000 jogos das categorias de base foram filmados e analisados até o 4-3-3 ser definido como esquema tático obrigatório para todas as categorias da seleção.

? Foto: JOHN THYS / AFP
? Foto: JOHN THYS / AFP

Outra mudança foi a contribuição financeira da Federação Belga e dos clubes. Cada equipe ficou responsável por investir uma determinada porcentagem nas categorias de base de acordo com a sua renda bruta anual. Quem ganhava mais dinheiro, deveria investir mais. A modalidade futsal também foi incluída no desenvolvimento das crianças. Eden Hazard, por exemplo, veio das quadras.

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Anos depois, a empresa ‘Double Pass’ foi contratada para auditar os clubes do país. A ideia era controlar se todas mudanças estavam sendo cumpridas, além de ficar responsável pelo controle dos equipamentos, pelo investimento na capacitação de novos treinadores e no desenvolvimento de academias no país. O aprimoramento também se desenhou fora de campo, fazendo com que o material humano fosse aperfeiçoado pela tecnologia.

? Foto: LEE SMITH / Reuters
? Foto: LEE SMITH / Reuters

A parceria entre a ‘Double Pass’ e a Federação Belga fizeram com que essas academias desenvolvessem nomes como Alex Witsel e Dries Mertens, todos convocados para os Jogos Olímpicos de 2008 e que seguiram sendo trabalhados até chegarem na Eurocopa. A questão da conscientização sobre imigrantes também foi trabalhada, o que permitiu que nomes Romelu Lukaku fossem captados.

De lá para cá, a Bélgica saltou da posição 71 para a liderança do ranking da Fifa. Também atingiu as quartas de final da Eurocopa de 2016 e a semifinal da Copa do Mundo de 2018. O modelo foi usado como exemplo por outros países que também focam no desenvolvimento das divisões de base. O resultado é uma geração com Kevin De Bruyne, Eden Hazard, Romelu Lukaku e Thibaut Courtois.