Existe uma nova causa movimentando jogadores do futebol inglês e, indiretamente, atingindo milhões de torcedores espalhados pelo mundo. Alguns dos principais nomes da Premier League resolveram se manifestar a respeito da tentativa de remoção de famílias árabes do bairro de Sheikh Jarrah, em Jerusalém Oriental, estopim para a nova onda de violência entre Israel e Palestina, iniciada na última segunda-feira.
Análise:Mal acostumado na Libertadores, Flamengo vê que nem sempre resolverá problemas criados por ele
O astro de maior brilho a se posicionar diante do conflito foi Sadio Mané, atacante senegalês do Liverpool seguido por 8,4 milhões de pessoas no Instagram. Com a mensagem “Palestina livre” e uma legenda simples, “de partir o coração”, o jogador, quarto melhor do mundo na última eleição da Fifa, levantou bandeira a respeito da guerra deflagrada desde a criação do Estado de Israel, em 1948.
De lá para cá, israelenses e palestinos medem forças por território, com vantagem para os judeus, que expandiram seus 14 mil quilômetros quadrados determinados pela Organização das Nações Unidas no fim da década de 1940 para os 20 mil quilômetros quadrados atuais.
O último episódio desse cabo de guerra acontece em Sheikh Jarrah, um pequeno bairro localizado em Jerusalém Oriental. Quatro famílias palestinas, um total de 40 pessoas, entre adultos e crianças, estão sendo forçadas a sair de suas casas, que ocupam desde 1950, para que famílias israelenses ocupem o lugar. Manifestantes palestinos tentam evitar a remoção.
Leia também:Fred vira febre em famílias tricolores, que batizam filhos com nome do ídolo do Fluminense
Esse caso menor, dentro do histórico de agressões entre as partes, deu início a uma reação em cadeia: ocorreram protestos violentos nas proximidades da Cidade Velha e o braço militar do Hamas, movimento islamista na Palestina, disparou mísseis na direção de Israel. A maior parte deles foi interceptado pelo sistema antibombardeio israelense. O país revidou a agressão com ataques aéreos contra o território palestino. As autoridades locais afirmam que até esta terça-feira morreram 28 palestinos e dois israelenses.
Martín:O futebol brasileiro cabe num B.O.
Bem longe dali, outro protagonista da Premier League também saiu em defesa dos palestinos. Mahrez, atacante argelino do Manchester City, foi um dos primeiros a se manifestar nas redes sociais. Na segunda-feira, postou em sua conta no Twitter, seguida por 2,6 milhões de pessoas, uma imagem da bandeira da Palestina com a hashtag “Salvem Sheikh Jarrah”. Nos comentários, é chamado de herói por outros simpatizantes da causa. O jogador vive o auge de sua carreira: foi campeão inglês pelo Manchester City nesta terça-feira, fez os dois gols do time na vitória que os levou à final da Champions e pode, no fim do mês, tornar-se campeão europeu.
Outro jogador do Manchester City se manifestou, o francês Benjamin Mendy, filho de senegaleses. Ainda que não exista nenhuma relação concreta entre os fatos, ambos são companheiros em um clube cujo dono é o governo dos Emirados Árabes, muçulmanos como os palestinos e, a priori, simpatizantes à causa.
Dois jogadores do Aston Villa, menos talentosos que Mané e Mahrez, fizeram questão de mostrar apoio aos palestinos de Sheikh Jarrah. Trezeguet, meia da seleção do Egito, foi mais direto à parcela árabe de seus 4,6 milhões de seguidores no Instagram, com uma postagem na língua. Curiosamente, seu companheiro de seleção, Salah, maior jogador muçulmano em atividade, ainda não se manifestou a respeito. Bem menos famoso, El Ghazi, holandês de origem marroquina, também foi às redes sociais:
“Você não precisa ser muçulmano para defender Gaza (referência à Faixa de Gaza, onde a maior parte dos palestinos se concentram). Basta ser humano”.
Ajuda no combate ao anti-islamismo
Quando se manifestam a respeito da Palestina, os jogadores da Premier League também estão interagindo com um público interno numeroso. De acordo com o Censo de 2011, muçulmanos formam o segundo maior grupo religioso do Reino Unido, atrás apenas dos cristãos. Eles são 4,4% da população, o que significa aproximadamente 3 milhões de pessoas. Já os judeus estão em menor número: 0,4% da população, ou cerca de 300 mil pessoas.
Na verdade, a ascensão cada vez maior de jogadores muçulmanos a posições de destaque no futebol mundial e a capacidade deles de se comunicarem com os fãs por meio das redes sociais fazem com que se diminua a resistência em relação ao islamismo, de uma forma geral. Um estudo da Universidade de Stanford apontou o sucesso de Salah com a camisa de Liverpool como a razão para a diminuição de quase 20% nos crimes de ódio contra muçulmanos na região do clube entre 2017 e 2019, uma vez que não houve nenhuma política pública no período e nenhum outro tipo de crime teve redução tão drástica.
Ao menos outros dois jogadores que atuam por clubes populares da Europa se manifestaram a favor dos manifestantes no caso de Sheikh Jarrah: o zagueiro Koulibaly, do Napoli e de Senegal, e o meia Bennacer, do Milan e da seleção da Argélia. No conflito aparentemente insolucionável entre Palestina e Israel, há também o combate das narrativas. Neste campo, os jogadores muçulmanos de destaque são armas poderosas a favor dos palestinos.
Fonte: O Globo