Na América do Sul, o Flamengo é imbatível há dois anos quando alia seu jogo tático coletivo ao desempenho técnico e físico individual de pelo menos alguns dos seus principais jogadores. Se apenas a primeira parte funciona, por ser mais automatizada, a equipe se torna previsível. Embora a insistência costume levar às vitórias, por vezes esconde o que faltou.
Na vitória de 4 a 1 sobre o frágil Unión La Calera, no Maracanã, pela segunda rodada da fase de grupos da Libertadores, o time teve mais uma vez o brilho de Gabigol, que marcou duas vezes, Arrascaeta, pelo quinto jogo com gol quando titular, além de uma assistência, e Pedro, que entrou no fim para fazer um gol de placa. Mas, houve falha do sistema defensivo novamente, o que liga o alerta para jogos mais pesados.
O setor ofensivo demorou a engrenar, depois acelerou, freou, e no fim atropelou. Já a zaga, que não passou apuros a maior parte do tempo, quando exigida comprometeu. Com o resultado, o Flamengo chegou a seis pontos e é líder isolado do grupo G. Com 14 gols na competição pelo clube, Gabigol está a dois de Zico, que fez 16 em toda a história.
Apesar do breve susto, o torcedor tem movito para comemorar. Rogério Ceni mandou a campo uma equipe em um esquema posicional, para abrir bem o campo. O Flamengo tocava bem a bola, como normalmente faz, mas não conseguia quebrar a última linha. Ou por falta de movimentação. Ou por que os meias demoraram um pouco a entrar no jogo.
Aos 31 minutos, a jogada do primeiro gol acaba por ser educativa. Arrascaeta e Gerson criam pelo lado esquerdo da área, e o uruguaio serve Gabigol com um passe de primeira. Técnica, velocidade e bom posicionamento aliados.
Em 35 minutos, o Flamengo praticamente resolveu o jogo contra os estreantes do Chile. Provava àquela altura que a ansiedade do começo da partida não se justificava. Bastava encaixar. O segundo gol veio em contra-ataque puxado por Bruno Henrique, que tocou para Arrascaeta, e o meia bateu no cantinho. Detalhe, a bola foi roubada na defesa por Éverton Ribeiro, que não apareceu tanto quebrando as linhas, mas taticamente esteve obediente como de costume.
Cochilo coletivo
Sem ser ameaçado, o Flamengo tentou ampliar o placar para até poupar jogadores de olho nos jogos mais complicados, contra La Calera e LDU, fora de casa. Mas ainda no fim do primeiro tempo diminuiu o ritmo, abusou do toquinho. Na etapa final, o La Calera mudou sua postura, colocou Valdívia em campo, e adiantou suas linhas. Mas o gol surgiu em uma jogada bastante conhecida desde 2019.
Em cima do novato Bruno Viana, que recebera chance de titular ao lado de Arão, os chilenos lançaram a bola longa, aproveitaram-se da linha de impedimento e Sáez diminuiu, ao tocar na saída de Diego Alves. E o Flamengo que tinha mais posse de bola, controlava o jogo, sentiu ao ser atacado. Por pouco, não sofreu o empate, em uma nova cochilada de Bruno Viana. O La Calera entendeu o recado e passou a marcar a saída de bola rubro-negra.
A esta altura o Flamengo já havia reclamado da não marcação de dois pênaltis, mas a verdade é que o comportamento da equipe, tatica e fisicamente, caiu muito. Sem a mesma intensidade e troca de passes, pareceu tentar administrar o resultado. E o que inicialmente indicava maturidade soava como soberba. Bastou o time adiantar suas linhas, pressionar um pouco a saída de bola, que os chilenos entregaram. Bruno Henrique interceptou um passe e tocou para Gabigol fazer o terceiro, aos 33 minutos.
Agora, sim, Ceni teria tranquilidade para rodar o elenco. Colocou primeiramente Vitinho, em seguida Pedro. A dupla protagonizou a jogada e o gol mais bonito da partida. O meia arrancou do lado direito, deu um drible da vaca no adversário, e lançou o centrovante. Aqui vale uma pausa. Pedro é o jogador que melhor aproveita o tempo em campo para marcar. Joga menos do que deveria; em 2021 quando começou a ter sequência se machucou. Mas sua técnica é impressionante. Ao receber a bola da ponta, domina, entra na área, e não toca para Gabigol, livre. Prefere carregar, driblar um zagueiro, e de frente com o goleiro, ainda tirar Arrascaeta com o braço, para ter espaço para o movimento perfeito. Um toque por cima, semelhante ao que Gabigol tentou no primeiro tempo e não conseguiu.
Antes de voltar à Libertadores, o Flamengo terá o primeiro jogo da semifinal do Estadual, sábado, contra o Volta Redonda. Um dos destaques da partida, Gabigol comemorou os resultados nos dois primeiros jogos, mas lembrou que ainda haverá dificuldades, como a altitude do Equador e o gramado sintético no Chile.
? Começar com pé direito é muito bom. Vencemos fora de casa, fazia tempo que o Flamengo não vencia na Argentina. Importante vencer em casa também, mas é só o começo. Temos altitude, campo sintético. Largar assim ajuda bastante ? disse o camisa nove, sobre o começo de euforia.
Fonte: O Globo