Kami nunca foi um jogador, nos primeiros anos de sua carreira, que moveu montanhas para que as pessoas gostassem verdadeiramente dele como pessoa.
Quando fui, brevemente, manager da paiN Gaming em 2012, Kami sempre alegava problemas em sua placa de som para não conseguir falar no Teamspeak. Dele, conhecíamos apenas o moleque franzino de 15 anos que convenceu a mãe a ir para São Paulo jogar um campeonato em janeiro, e mesmo presencialmente ele mal falou
– Você é o Kami, né?! Muito prazer, LeonButcher – sorri, estendendo a mão para ele, que sorriu sem mostrar os dentes e olhou para baixo, estendendo a mão de volta, e me cumprimentando sem apertar.
Sempre tímido e reservado, Kami vivia suas raras meia-palavras e cumprimentos fortes em Summoner?s Rift. Desfilando pelas rotas como se feito de água, identificando brechas mínimas nas lutas como se fossem óbvias. “E o Kami? é o Kami. É simplesmente um gênio?, disse MiT, técnico no título do CBLoL 2015 e um dos melhores amigos do “tipo mid?.
Ver Kami em jogo era saber que ele poderia estar sem fazer nada no jogo, mas que estávamos a um piscar de olhos de presenciar alguma coisa realmente impressionante.
E com ele, o sorriso de canto de boca.
Aquele maldito sorriso.
Quantos lamentos de adversários não moraram neste sorriso?
Quantos gritos de companheiros de equipe?
Quantas mãos na cabeça não foram levantadas?
Em casa, no WTC Golden Hall, no Allianz Parque, no Mundial?
Oh Kami. Oh my fucking god.
Kami nunca precisou se expressar por textos ou vídeos para explicar quem era ele. Sua maior arte sempre foi pintada nas cores do League of Legends. Seu legado foi construído com títulos, grandes jogadas e o respeito de todos os jogadores do Ferro 1 ao Desafiante, amadores ou jogadores profissionais, brasileiros e estrangeiros.
The Brazilian Faker, disseram, no Mundial 2015. O mesmo em que eu procurei a SKT T1 para produzir a primeira foto dos dois juntos, e que, no ano seguinte, repetimos, nas lentes do incrível Bruno Alvares, o Foca.
– Faker, você pode se sentar aqui? – Disse, apontando uma cadeira da plateia, enquanto ignorava o manager da SKT e os Rioters gringos que me diziam que Faker não tinha tempo para tirar fotos.
Com um breve “ok?, Faker sentou-se na cadeira. Não precisei falar para o Kami que ele deveria sentar ao lado do coreano, ele já se posicionou enquanto eu saí rapidamente.
– Hi again, I?m Kami – Disse Kami, claramente nervoso, virando-se para Faker.
– Hi, Kami – Disse o melhor da história.
Mesmo quem acompanha League of Legends desde a despedida de Kami do competitivo, em 2017, conhece e respeita o seu legado, e provavelmente virou mais um fã que implorava por sua volta ao jogo.
Porque Kami entendeu que conquistou mais do que respeito com seu jogo genial e seus títulos. Com os fãs, também veio carinho. E não era justo ele não devolver este mesmo carinho quando as pessoas tiram tempo delas – mesmo dez preciosos segundos – para mandar uma mensagem no chat de uma transmissão que ele não verá ou num tuíte que ele jamais lerá – mas que irá sentir.
Por isso, Kami começou a aparecer em câmeras, fazer mais streams, engajar mais com o público. E isso foi um motivo claro de ter anunciado sua volta para o competitivo em 2020. Ele esteve perdido no que queria fazer, mas o amor sempre moveu sua vida.
Seja o de sua mãe quando crescia, seja o do amor para o League of Legends durante sua carreira, seja o amor de seus fãs durante sua pausa. Tudo indicava que o próximo amor poderia ser encontrado no próximo “Bem-vindos à Summoner?s Rift?.
Mas a voz da narradora nunca mais foi ouvida.
As atuações brilhantes nunca mais aconteceram.
Os segundos que nos separam de uma grande jogada nunca foram cronometrados.
Kami nunca voltou.
Há quem diga que este ano de 2020 tenha sido um fracasso para Kami.
Há quem diga que a paiN e o Meio apenas pensaram em dinheiro e comerciais.
Há quem diga que isso forçaria Tinowns a jogar melhor, com uma sombra junto.
Vocês estão errados.
Respeitem a história do Kami.
Respeitem a sua dedicação e o seu suor. Suas conquistas e suas falhas, seus acertos e seus erros. Suas idas e vindas. Os momentos em que se perdeu e também os que se encontrou – como é agora.
Durante todo o seu vídeo de despedida oficial, Kami parecia à beira de derrubar uma lágrima, mas não o fez. Mostrou-se forte quando não necessariamente precisava. Talvez mais para nós entendermos de fato a firmeza de sua decisão.
Mas depois de tanto que você nos entregou, Kami, prometo que respeitaríamos suas lágrimas como respeitamos o seu sorriso de canto de boca.
Pode chorar, Kami.
Fonte: The Enemy