Outra vez, a dificuldade do Flamengo de defender revela-se crucial. Porque, em última análise, a má proteção da área em dois cruzamentos quase seguidos mudou o rumo de um jogo que o time tinha sob controle e decretou a eliminação na Copa do Brasil nos 3 a 0 do São Paulo, placar bem grande para o que foi o jogo, aliás.
Não foram erros similares aos mais gritantes dos tempos de Domènec Torrent, quando o drama rubro-negro era se espaçar, se descoordenar quando pressionava, e mal, no ataque. Neste aspecto, o time melhorou. Por outro lado, parece ter perdido boa parte dos mecanismos ofensivos que funcionavam com o catalão. O que leva a uma conclusão.
A primeira eliminação do Flamengo em 2020 tem muito a ver com sua temporada acidentada demais. Não há elenco que resista a surto de Covid, desfalques em série e duas trocas de treinador em três meses. Rogério ainda não teve tempo de consertar a defesa, tampouco terminou de implantar o que pensa para um ataque que antes de sua chegada parecia ajustado ? e os desfalques não ajudam o novo treinador. Sem discutir se foi certo ou errado demitir Domènec, uma das questões do Flamengo neste momento é parecer estar sempre recomeçando desde que Jorge Jesus saiu.
Neste ponto, e diante da loucura que é o futebol brasileiro, a queda na Copa do Brasil pode oferecer algumas semanas livres para treino. Mas elas não virão antes do mata-mata com o Racing pela Libertadores.
Mas é curioso ter terminado em derrota por 3 a 0 um jogo que o Flamengo dominou no primeiro tempo. Mas o fez por 85 metros de campo, sem jamais encontrar o passe final, a infiltração, a ocupação da área. O bom jogo rubro-negro ia até a entrada da área de um São Paulo desconfortável e que se adaptou a um estilo diferente de seu habitual. E sob este aspecto, o tempo que Rogério Ceni ainda não teve jogou a favor de Fernando Diniz, há um ano no cargo no São Paulo. Seja para tornar seu time mais eficiente ao defender, seja pela capacidade de se adaptar a tipos de jogos distintos, com menos posse, menos controle da bola e mais escapadas rápidas para o ataque.
Primeiro, porque o Flamengo pressionava bem, o que é uma evolução que Rogério Ceni conseguiu com rapidez. Ao marcar na frente, o time rubro-negro já não se espaça tanto. Com isso, o Flamengo imprensava um São Paulo que tinha dificuldade de sair jogando. A bola era do rubro-negro, a questão era o que fazer com ela quando o jogo chegava à zona de definição.
A ideia era ter Willian Arão entre os zagueiros Thuler e Léo Pereira. A partir daí, Vitinho, que começava pelo lado direito no 4-2-3-1 rubro-negro, movia-se para o centro, juntando-se a Arrascaeta como mais um meia. Matheuzinho abria o campo pela direita e Michael pela esquerda.
Com frequência o Flamengo achava Arrascaeta entre as linhas de defesa do São Paulo. Mas faltava a opção de profundidade. Por duas vezes, o uruguaio teve a bola em ótimas condições, mas não conseguiu fazê-la chegar a Bruno Henrique.
Taticamente superado, o São Paulo passou a apostar em ataques rápidos às costas da defesa do Flamengo, afinal o empate obrigava os cariocas ao risco. Mas foi com a defesa rubro-negra posicionada atrás que vieram os dois cruzamentos fatais do segundo tempo e os dois gols de Luciano em dez minutos. Em ambos, a linha defensiva do time carioca se comportou mal: o mata-mata estava quase sentenciado.
O jogo, na prática, acabaria de vez aos 17 minutos, no pênalti perdido por Vitinho. E, diga-se, nos 180 minutos, a eliminatória foi muito condicionada por erros individuais terríveis do Flamengo. O 5 a 1 do placar agregado é bem pesado.
Foi curiosa, e talvez um efeito da insana maratona brasileira, a sensação de que Rogério Ceni jogou a toalha antes do fim, ao colocar Lázaro, Lincoln e Pedro Rocha e tirar Bruno Henrique, Vitinho e Arrascaeta, este em recuperação física. Como se pensasse nos próximos compromissos. Antes, o treinador surpreendera ao colocar o jovem meia Pepê no lugar do zagueiro Thuler. No lugar de se tornar mais ofensivo, o Flamengo se desorganizou e ainda viu Pablo fazer 3 a 0. Segue a corrida contra o tempo de um Flamegno que tenta se encontrar neste 2020.
Fonte: O Globo