SÃO PAULO – Estudo que analisa a prevalência de anticorpos para o coronavírus Sars-CoV-2 na cidade de São Paulo estima que 26,2% da população adulta da capital, ou pelo menos cerca de 2,2 milhões de pessoas, já se contaminou com o vírus causador da covid-19.
O mapeamento, conduzido em uma parceria de pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e do Grupo Fleury com o Ibope Inteligência, está em sua quarta fase de análise e confirma uma tendência que já tinha aparecido anteriormente. O vírus – que continua se espalhando pela cidade, apesar de em velocidade menor – afeta disproporcionalmente negros e pardos, os mais pobres e os que têm menos escolaridade.
A chamada soroprevalência da população pôde ser inferida a partir da análise laboratorial de amostras de sangue de 1.129 pessoas de 18 anos ou mais feita no início do mês. O resultado aponta uma alta de casos em relação à etapa anterior da pesquisa, do fim de julho, que havia detectado a presença de anticorpos em 17,9% das amostras. Isso indica que cerca de 700 mil adultos foram infectados na cidade em pouco mais de dois meses.
A contaminação continua mais comum nos distritos mais pobres da cidade – 30,4% -, ante 21,6% nos distritos com renda mais alta. A maior parcela se encontra entre os adultos que têm apenas o ensino fundamental: 35,8%. É mais que o dobro da taxa de infecção entre aqueles com ensino superior, de 16%. Confira a distribuição de casos no gráfico abaixo.
O projeto SoroEpi MSP, que conta com apoio do Instituto Semeia e Todos pela Saúde, é um levantamento paralelo e independente do inquérito sorológico conduzido pela Prefeitura. Em ambos, se busca estimar a quantidade de adultos que podem já ter se exposto ao coronavírus na capital, além dos casos confirmados. Oficialmente, de acordo com dados da administração municipal, a cidade já registrou 352.953 casos (até quarta-feira, 21) e 13.358 mortes. Mas a soroprevalência dá uma noção mais ampla da distribuição do coronavírus.
O monitoramento que vem sendo feito pela Prefeitura se vale dos testes rápidos, que podem dar resultados falso-negativos ao não detectar anticorpos que já tenham diminuído muito no corpo. O do Fleury trabalha com exames laboratoriais mais sensíveis, que detectam mesmo taxas bastante baixas. Por isso a diferença dos resultados.
A última fase do inquérito da Prefeitura, divulgada no último dia 13, indicou que apenas 13,6% da população da capital paulista contraiu o novo coronavírus. O monitoramento considera adultos e crianças.
O biólogo Fernando Reinach, colunista do Estadão, que foi responsável por reunir os pesquisadores participantes do projeto, explica que desde a terceira fase estão sendo aplicados dois testes em cada participante da pesquisa, o que aumenta a segurança na análise. “A quantidade de anticorpos pode estar caindo, mas se estiver no corpo, vai dar positivo”, diz.
Ele defende que a análise mais aprofundada pode ajudar a definir melhor as políticas públicas. “Uma coisa é falar que 13% da população já foi infectada, outra é ver que são 26%”, afirma.
Dados levantam debate sobre imunidade de rebanho
A análise feita pelo Fleury também discorda de uma noção que tem crescido de que infectados há mais tempo acabam perdendo os anticorpos. O estudo, que começou a ser feito em abril na cidade, sempre registrou aumento da soroprevalência a cada fase. “A taxa de soro reversão estimada utilizando os dois testes é muito baixa. Portanto, a soroprevalência estimada neste estudo representa os habitantes adultos do município de São Paulo já infectados pelo Sars-CoV-2 que produzem anticorpos detectáveis por pelo menos um dos dois testes utilizados”, concluem os autores.
“A grande questão que temos no momento é tentar entender a queda que estamos vendo na cidade no números de novos casos e de mortes. O que todo mundo se pergunta é: será que isso se dá porque as medidas de prevenção estão muito boas, todo mundo está usando máscara, mantendo o distanciamento ou se o fato de já ter passado de 20%, 30% a soroprevalência o vírus começa a ter mais dificuldade de circular. Provavelmente é uma mistura dessas duas coisas”, reflete Reinach.
Ele acredita que com apenas 13%, como indica a Prefeitura, talvez não fosse possível já ter o efeito que está sendo observado. O número obtido pela gestão municipal não tem subido nos últimos levantamentos.
Para o pesquisador, os dados também refletem que quem está se cuidando está se infectando bem menos. “Claro que importa quantas pessoas vivem em uma mesma casa, mas imaginamos que quem tem mais condições de se cuidar, como quem tem ensino superior, é o grupo com menos infectados, só 16%”.
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Fonte: Terra Saúde