Durante o quase um ano em que não pôde treinar a seleção, Tite imaginou algumas soluções para o time. E a Bolívia permitiu ao Brasil exercitar todas elas. Em situações assim, é possível que a prática seja bem ou mal feita. E a seleção foi bem, ainda que, diante da fragilidade do rival, muito mais do que celebrar os 5 a 0, seja útil examinar o que funcionou na estreia das Eliminatórias. E o que pode melhorar.

O aspecto mais importante do plano de Tite se mostra quando o Brasil se instala no campo adversário ? o que compreendeu quase todo o primeiro tempo ontem. Renan Lodi ataca bem aberto na esquerda, de onde Neymar parte para virar um meia junto a Coutinho, ambos por trás de Roberto Firmino. Na direita, Éverton joga aberto.

Ao atacar, a seleção se alinhava quase num 2-3-5: os dois zagueiros atrás, Danilo formando uma linha de três articuladores com Casemiro e Douglas Luiz, além dos cinco homens na frente.

Outro ponto que chamou atenção foi a escolha por Douglas Luiz e não por Bruno Guimarães. Aparentemente, a busca era por ter pela esquerda um volante que, ao bom passe longo e condução de bola, cobrisse Lodi.

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Estas ideias, aliás, estiveram muito presentes na primeira etapa. Atacando mais pelo centro, como um meia, Danilo achou Marquinhos no primeiro gol. Antes, este Neymar “meia ofensivo? achara Lodi no lance que Éverton desperdiçou. E o passe longo de Douglas Luiz iniciara a jogada de outro gol perdido, este por Marquinhos. Já no segundo gol, o entendimento entre Neymar e Lodi gerou exatamente o que Tite procura: com homens abertos dos dois lados, a defesa boliviana se viu obrigada a marcar toda a largura do campo até se espaçar. O movimento de Neymar gerou espaço para Lodi infiltrar entre lateral e zagueiro antes de cruzar e dar o 2 a 0 a Firmino.

Neymar como um meia ofensivo pela esquerda e Coutinho um pouco mais para a direita não eram fixos, tinham certa liberdade. Surgiram associações entre os dois e também entre Neymar e Lodi. Além disso, Douglas deu sustentação ao meio, além de por vezes se projetar no ataque.

Com o goleiro caído, Roberto Firmino parte para a comemoração: Brasil aplicou 5 a 0 na Bolívia Foto: AMANDA PEROBELLI / AFP
Com o goleiro caído, Roberto Firmino parte para a comemoração: Brasil aplicou 5 a 0 na Bolívia Foto: AMANDA PEROBELLI / AFP

 

Mas mesmo diante da pobre Bolívia, apareceram aspectos a evoluir. Contra um rival todo dedicado a bloquear sua área, o Brasil tinha dificuldade de infiltrar pelo centro e buscava muito os lados. É natural num sistema novo de um time que não jogava havia um ano. Mas encobre uma questão crucial sobre Firmino.

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É injusto dizer que ele jogou mal. Deu opção de profundidade ao fazer o 3 a 0 em belo passe de Neymar e fez boas combinações até sair no segundo tempo. Mas, nesta fase do jogo, a Bolívia já oferecia o espaço para a seleção atacar em velocidade, era outro cenário. Antes disso, no primeiro tempo, ficou claro que só o tempo fará Firmino, um centroavante que sai da área para armar, Coutinho e Neymar entenderem como repartir este espaço na criação. E sem que a seleção perca presença na área.

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Outro ponto é manter contra rivais mais fortes o bom nível de pressão que o Brasil fez no ataque. Só assim não será obrigado a bater sempre contra um muro defensivo. Muro, aliás, que já não havia quando Tite deu oportunidades a Rodrygo, Alex Telles, Everton Ribeiro e Felipe. E foi Rodrygo quem cabeceou a bola do quarto gol, desviada por um zagueiro.

Quanto a Neymar, é bom sinal que a seleção tenha goleado sem uma partida de gala dele. Mas seu entendimento do modelo de ataque de Tite é promissor. No segundo tempo, com mais espaço, fez belos lances. Num deles, criou o gol de Coutinho.