O Superior Tribunal de Justiça Desportiva do vôlei (STJD) decidiu adiar, na manhã desta terça-feira, o julgamento que seria realizado a partir das 18h (de Brasília), da jogadora de vôlei de praia Carol Solberg. Ela gritou “Fora, Bolsonaro” após a premiação pela conquista da medalha de bronze, na primeira etapa da temporada do Circuito Brasileiro, em entrevista transmitida pela TV, no CT da Confederação Brasileira de Vôlei (CBV), em Saquarema, em 20 de setembro. Era o retorno do ciurcuito, em esquema “bolha” após paralisação por causa da pandemia do novo coronavírus.

O advogado de defesa da atleta, Leonardo Andreotti, especializado em direito esportivo e ex-presidente desse mesmo STJD, confirmou para O Globo o adiamento e explicou que o tribunal recebeu pedidos de intervenção de terceiros, da Associação Brasiliera de Imprensa (ABI) e do Movimento Nacional de Direitos Humanos, e que o relator Robson Luiz Vieira retirou o processo da pauta para análise.

Leonardo não quis se manifestar sobre o adiamento mas afirmou que esta é uma questão normal dentro do processo. Ainda não há nova data para o julgamento em primeira instância.

?  Se forem admitidos no processo como terceiros interessados, poderão ter papel direto no julgamento, inclusive, na minha opinião, podendo recorrer da decisão ao Pleno do STJD. Não é meramente um acompanhamento, mas uma efetiva participação. Por essa razão o código exige prova de legitimidade para o pleito, bem como o comprovação de que haja uma vinculação direta com a questão discutida no processo ?  explicou Leonardo.

O advogado afirma que não é qualquer associação que poderá ser admitida no processo, somente aquelas que tenham vinculação direta com a questão discutida e um interesse legítimo. Ou seja, deve-se demonstrar a real relevância de sua participação.

A intervenção de terceiro é prevista no artigo 55 do Código Brasileiro de Justiça Desportiva que diz: “A intervenção de terceiro poderá ser admitida quando houver legítimo interesse e vinculação direta com a questão discutida no processo, devendo o pedido ser acompanhado da prova de legitimidade, desde que requerido até o dia anterior à sessão de julgamento”.

Relembre o caso

O episódio viralizou nas redes sociais e a jogadora foi elogiada por setores também contrários ao presidente e atacada por seus aliados. Ela contou que sofreu ameaças.

A Confederação Brasileira de Vôlei (CBV) se posicionou repudiando a atitude da jogadora, assim como a Comissão de Atletas do Vôlei, eleita para representar os atletas.

Já a Comissão de Atletas do Comitê Olímpico do Brasil (CACOB) disse, por meio de sua integrante, Isabel Swan, que não cabe ao órgão opinar sobre o caso de Carol Solberg e sim, ajudá-la no que for preciso. Mas, pessoalmente, ela se mostrou surpresa com a possível punição, desproporcional, pedida pela subprocuradoria.

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Em sua conta na rede social, Tiago Camilo, presidente CACOB disse que “Nossa Comissão almeja que a atleta possa ter um julgamento justo e com a mesma jurisprudência de casos anteriores envolvendo atletas brasileiros”, em referência ao caso dos jogadores Wallace e Maurício Souza, também do vôlei, que declararam apoio ao então candidato à presidência, em 2018, e não receberam qualquer punição.

Em um momento em que o esporte mundial abre espaço para a auto expressão de seus atletas, como a NBA, NFL e a F-1, e com a possibilidade de até o Comitê Olímpico Internacional (COI) relaxar sua mais severa regra do tipo, o vôlei do Brasil pode pegar a contramão.

Quando: O julgamento em primeira instância seria nesta terça-feira, a partir das 18 horas. Mas não há nova data.

Dinâmica: Continuará a mesma prevista. Primeiro farão suas sustentações orais o advogado de defesa de Carol, Leonardo Andreotti, especializado em direito esportivo e ex-presidente desse mesmo STJD, e o subprocurador Wagner Dantas. Carol fala em seguida. O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, que faz parte da banca dos advogados da jogadora, não irá falar.

Objetivo da defesa:Que o julgamento seja técnico e não seja político, no sentido de deixar de fora da discussão o apoio ou oposição a Bolsonaro.

Linha de defesa: A defesa da atleta está confiante e Leonardo Andreotti explica que o regulamento da competição que Carol participava veta manifestações que possam prejudicar a imagem da entidade, de seus patrocinadores e de seus parceiros comerciais. E que não se verificou qualquer ofensa à CBV e aos demais destinatários da norma.

O que pede a acusação: Pena máxima em cada um dos dois artigos em que ela foi denunciada. A atleta pode levar uma multa de R$ 100 mil e seis torneios de suspensão.

No que se baseia a denúncia: Dois artigos do Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD): o 191 ? deixar de cumprir o regulamento da competição ? e o 258 ? assumir qualquer conduta contrária à disciplina ou à ética desportiva não tipificada pelas demais regras do código.

Por que a CBV repudiou Carol: Segundo o subprocurador Wagner Dantas, Carol coloca em risco o patrocínio do Banco do Brasil ao vôlei ? ele não cita expressamente, mas teme-se que o governo Jair Bolsonaro (sem partido) retalie a modalidade cortando o patrocínio, que começou em 1991 e tem contrato vencendo em abril do ano que vem.

O que está em jogo: Ainda que diga respeito apenas ao vôlei e ao regulamento do Circuito Brasileiro de Vôlei de Praia, o julgamento vai balizar, para a opinião pública mundial, se o movimento esportivo no Brasil aceita, ou não, opiniões políticas de atletas.

Por que o momento é marcante: A NBA, NLF e a F-1, por exemplo, permintem que seus atletas se manifestem com mais liberdade. Além da questão antirracista, jogadores de basquete dos Estados Unidos fazem campanha para que a população vote nas eleições presidenciais. Além disso, o Comitê Olímpico Internacional, pressionado pelo momento atual no mundo, pode relaxar sua Regra 50 que não permite nenhuma manifestação política, religiosa ou racial na grande maioria dos locais e situações olímpicas. Mas, em entrevistas, como foi o caso da Carol,  é permitido.

Pode haver recursos: Em caso de condenação, há a possibilidade de recurso junto ao Órgão Pleno do STJD do Voleibol. O caso está ainda na 1ª instância, na Comissão Disciplinar.

Relatores: Por sorteio, o advogado catarinense Robson Luiz Vieira foi escolhido como relator do processo nessa 1ª Comissão Disciplinar do STJD do vôlei. Os demais auditores são Otacílio Soares de Araújo (presidente da comissão), Bruno Castello Branco, Rodrigo da Paz Ferreira Darbilly e Marcos Eduardo Bomfim. A comissão ainda tem dois suplentes, para ausências dos titulares. São eles Vanderson Maçullo Braga Filho e Gustavo Silveira.