Na eterna confusão entre coletivo e individual que marca as eleições de melhor jogador do mundo, não será a final da Liga dos Campeões a solução da disputa. Não foi o jogo de Lewandowski, muito menos de Mbappé ou de Neymar. A taça que realmente importa foi para quem tinha mais argumentos coletivos. O futebol do Bayern, time de 11 jogos e 11 vitórias, colocou em segundo plano disputas pessoais e deu ao clube seu sexto título europeu ao bater o PSG por 1 a 0.

O que não significa que não tenha havido destaques individuais. A tentativa de pressão do PSG para interromper a construção de jogadas do Bayern se desfez na atuação cerebral de Thiago Alcântara, dono de repertório de passes e entendimento do campo admiráveis. E a construção do gol decisivo de Coman, se ressaltou a capacidade de se associar no ataque deste time alemão, torna impossível não reparar outra vez em Kimmich. O cruzamento que encontra a cabeça de Coman é precioso.

Campeões da Champions League Foto: Editoria de arte
Campeões da Champions League Foto: Editoria de arte

 

A final de Neymar teve três partes distintas, todas vinculadas ao contexto coletivo do time. Na primeira, enquanto seu time conseguiu as escapadas em velocidade que procurava, o brasileiro até participou de jogadas importantes e perdeu boa chance, parando duas vezes em Neuer. Di Maria e Mbappé também desperdiçaram, sendo que o jovem francês teve a chance mais clara de gol. E já que se falou tanto de melhor do mundo, a perda do título enfraquece argumentos a favor de Neymar: lesões e a interrupção da temporada francesa pela pandemia o fizeram jogar menos partidas do que o desejável. Neste ponto, Lewandowski, Kevin De Bruyne e Mbappé têm qualidade e quantidade de exibições para ostentar.

Voltando ao jogo, o primeiro tempo deu a sensação de que uma expectativa de confirmaria: a velocidade e a técnica do ataque francês poderiam causar dano à máquina alemã, que adianta seu time e tenta pressionar o adversário contra seu campo.

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Thomas Tuchel, técnico do PSG, “pagou pra ver?. Em muitos momentos, defendeu com apenas sete ou oito jogadores, deixando Mbappé, Neymar e por vezes até Di María à frente. Tanto para poupá-los quanto para preocupar a linha de defesa do Bayern. Laterais e zagueiros do time alemão relutavam em se adiantar tanto, afinal tinham de que se ocupar. A ideia era “partir? minimamente o Bayern e fazer com que a pressão da equipe de Hansi Flick, que muitas vezes se torna uma avalanche, perdesse força.

Repertório alemão

De certa forma, ocorreu. Lewandowski teve uma bola na trave e uma cabeçada perigosa na primeira etapa, mas o Paris Saint-Germain não chegou a se ver contra as cordas. Os franceses conseguiam pressionar a saída de bola do Bayern e o jogo alemão tinha menos fluidez .

Mas havia um problema. Criou-se um espaço imenso para os meias do PSG defenderem. Marquinhos fez grande jogo, mas foi sendo levado à exaustão junto com Paredes e Herrera. Aos poucos, Kimmich e Davies, pelos lados, começaram a avançar mais, sendo que o lateral-direito mais claramente se juntava aos meias. O PSG foi perdendo o controle do centro do campo.

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Isso isolou de vez os atacantes. Foi a segunda fase do jogo de Neymar, em que ele praticamente só recebia bolas de costas e com condições ruins para progredir. Além disso, gradativamente o PSG perdia fôlego e não tinha outras armas para criar. Dependia demais das bolas esticadas para atacar o espaço às costas da defesa do Bayern. Já o repertório dos alemães é vasto e começava a sobressair.

Este time alemão simboliza uma era do jogo em que a pressão no campo ofensivo é arma inegociável, mas também sabe sair de trás tocando, trocar passes e criar espaços para atacar de diversas formas. No lance do gol, Thiago Alcântara faz um passe que vence uma linha inteira de marcação do PSG. Na sequência do lance, uma síntese do jogo: seis homens do Bayern atacando sete defensores franceses, até Kimmich cruzar com precisão, Kehrer ficar em dúvida entre atacar Lewandowski ou se ocupar de Coman às suas costas. Efeitos de um time que ataca a área com muita gente. Por fim, o defensor do PSG não fez uma coisa, nem outra: de cabeça, Coman marcou.

A frustração de Neymar

Veio a terceira fase do jogo do PSG e de Neymar, que pode ser definida pela palavra frustração. O brasileiro, sem encontrar apoio coletivo, acumulou perdas de bola. O time de Tuchel parecia programado demais para atacar espaços, não para construir desde a defesa quando em desvantagem. Marquinhos ainda teve uma boa chance e, no fim, Choupo Moting teve outra.

O PSG, que historicamente pareceu muito mais uma soma de ambições individuais abrigadas num projeto de dominação dos qataris, é uma presença nova no grande palco da Champions. Só agora vê amadurecer um projeto esportivo. Já o Bayern, representante da velha guarda, um histórico gigante, viu supercampeões como Robben, Ribéry, Lahm e Schweinsteiger saírem de cena e se reconstruiu. Sete anos depois, reencontra a glória europeia.