Mário Bittencourt ganhou notoriedade como advogado. Agora, como presidente do Fluminense, ele precisa exercer a função de gestor e político, justamente em um período de crise financeira agravada pela pandemia e uma Medida Provisória que mexe nos direitos de transmissão dos clubes ? a principal fonte de receita. Ao GLOBO, ele conta como foram os últimos meses, o que inclui a contratação de um ídolo como Fred e, ao mesmo tempo, o exercício de escolher quais boletos pagar primeiro.
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Levando em conta os recursos limitados, qual é a meta do Fluminense para o Brasileiro?
Nossa meta realista é buscar uma classificação para uma pré-Libertadores. Normalmente, com folha do tamanho que a gente tem (R$ 3,6 milhões), a média dos pontos corridos do Brasileiro é de que este valor de folha seja de meio de tabela. Mas a gente acha que conseguiu montar um elenco que vai conseguir botar a gente na primeira página e com possibilidade real de classificar o Fluminense para a pré-Libertadores.
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O Odair pede algum reforço para o Brasileiro?
A gente discute a possibilidade de trazer alguns jogadores em razão da longevidade do campeonato. Especialmente num ano como este. Estamos discutindo trazer uns três ao longo do Brasileiro para ficarmos mais sólidos.
O contrato do Nenê acaba no fim do ano e ele tem sido um dos destaques do time. Já conversam pela renovação?
O Paulo Angioni já iniciou uma conversa com o representante dele. A gente tem uma questão em razão da pandemia que vocês precisam levar em conta: todos com quem a gente senta para renovar são jogadores que precisamos no mínimo estender o contrato até fevereiro por causa do Brasileiro. Mas você há de convir que, do outro lado, há o desejo do jogador de que se prorrogue por mais um pouco. E da gente também. Porque o jogador pode não aceitar e aí faltando 60 dias para acabar o campeonato a gente perder 40% do elenco. Mas a tendência é que se estique até dezembro do ano que vem com a mesma remuneração que ele já vinha ganhando. Isso é a nossa proposta. Acho que um jogador da idade dele tem que ser por fases mesmo. Prova disso é o Fred, que tem 36, e com quem não fiz contrato muito longo. Deve acabar em 2022 mesmo.
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Por falar em Fred, já conseguiram mensurar o efeito da chegada dele no clube?
A gente tem um número global. Sócios novos desde a chegada dele foram 13.009. Sócios novos desde a campanha “É pelo Flu? (lançada no fim de junho pela própria torcida), 10.697. Mas aí o Fred está contido neste período também. Então não atribuo os 13 mil só a ele e nem os 10 mil ao “É pelo Flu?. O sócio futebol tinha uma receita média anual de R$ 9 milhões. Aumentou para R$ 13 milhões. O que é importante dizer? O tíquete médio de novos sócios é de R$ 20. O total é de R$ 30,83. Antes, era R$ 37. Significa que a maioria das adesões são de planos menores que o de R$ 35. A gente fica muito feliz com o aumento global. Mas é importante também aumentar a média nas categorias de R$ 35. Mas o resultado é muito positivo, pois estamos num período em que o torcedor não pode ir aos jogos.
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Há algum tempo o Marcos Paulo é o jogador mais visado do elenco. O clube recebeu alguma proposta ou sondagem por ele?
Zero. Nem sondagem, nem proposta. Tudo o que a gente ouve é especulação. A prova é o Gilberto. A proposta chegou ontem (terça-feira) e a gente fechou a operação hoje. Quando tem proposta a gente fala. Porque ou aceita ou recusa. Não tem muito segredo. O resto é um glamour que as pessoas criam. Que o Marcos Paulo é a bola da vez todo mundo sabe. Já falei sobre isso. Uma hora vai chegar uma proposta e a gente vai avaliar se é válida ou não. E vamos seguir adiante.
A venda de atletas é a segunda maior fonte de receitas. Como a crise do mercado te afeta?
Depois da pandemia ainda estamos pisando em ovos. O Gilberto está sendo a primeira transferência do futebol brasileiro depois do Jorge Jesus. O mercado ainda está muito parado. E vai ter que se reequilibrar. Foi importante a divulgação dos números pelo estudo do Itaú porque no final ele diz que o Fluminense vai ter que vender jogador. É isso. A grande solução do clube no momento é vender jogador para ter que pagar dívida. E vai ser assim durante algum tempo.
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Tem algum número do prejuízo cauusado pela pandemia?
A gente ainda não conseguiu aferir o prejuízo. Estamos sem bilheteria. Em compensação, a gente conseguiu vender um jogador agora. Apresentamos o orçamento e o que foi realizado até agora para o Conselho. Fizemos uma readequação. Só no futebol, a estimativa no início do ano era gastar R$ 42 milhões com folha salarial/imagem. Gastamos até agora R$ 35,6 milhões. Menos 16% porque apertamos um pouco mais por causa da pandemia. Mas a receita caiu bastante também.
Como tem feito para colocar contas em dia, tentar pagar o que deve?
A gente optou pela metodologia da gestão de risco. Faço o gerenciamento do risco de cada dívida, de cada pagamento. Não é uma questão de fluxo. Porque a gente tem sempre menos dinheiro do que a gente precisa. Não há um dia aqui que eu tenha mais dinheiro do que eu preciso para pagar. É uma gestão semanal. Avaliamos os pagamentos pelos riscos que ele tem, pela relevância. E pelos meus conhecimentos de ter advogado pelo clube e advogar pelas áreas que o Fluminense mais transita, desportiva e trabalhista, criamos um comitê de gestão de risco. Participam o presidente, o financeiro e o jurídico. Não sai pagamento do Fluminense hoje que não passe por esses três. Toda planilha passa por mim, vejo tudo. A gente entra em contato com os credores, se antecipa. Quando sentimos que não vamos conseguir pagar, ligamos para dizer o motivo. A gente explica, renegocia, empurra para frente. Às vezes, estamos devendo uma parcela e não conseguimos pagar inteira. Ligamos e falamos que vamos pagar um pedaço. É uma gestão diária. Optamos mais por gerir os riscos do que gerir as finanças.
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Há caminhos jurídicos para explorar também na busca por receita?
Tem um processo do Cavalieri… É penhora. Teve um dia que eu falei: tenho certeza que tem excesso de execução nesse processo. Cansei de levantar dinheiro no passado com penhoras a mais. Isso é por uma série de questões. Elogio o jurídico e financeiro do clube. Quando dei esse drive para ver se tinha excesso de valor bloqueado, eles viram. No caso do Cavalieri, tinha R$ 2,6 milhões bloqueados. Estava em juízo. Não tinha ido para ele e nem voltado para nós. Fizemos um embargo de execução, conseguimos mostrar que R$ 1 milhão estava a mais e esse dinheiro voltou para o caixa. Não foi por má fé do goleiro. É um exemplo. Tivemos outras situações.
Como está a relação com o Independiente Del Valle e o Boston River, clubes que acionaram o Fluminense na Fifa por causa de dívidas?
Quando o Independiente Del Valle veio jogar contra o Flamengo, aproveitei a vinda dos caras para conversar com o presidente do clube. Eu me apresentei, dizia que devia dinheiro e não conseguiria pagar de uma vez. São cerca de R$ 16 milhões. Pagamos a primeira parcela, de 300 mil dólares. Repactuei para pagar em dois anos e meio. A primeira parcela vencia no meio da pandemia. Eu liguei e renegociei. Pedi para empurrar para agosto. R$ 1,5 milhão é metade da minha folha. Paguei a primeira parcela do De Amores, do Boston River.
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A dívida Fifa é a que mais dá dor de cabeça?
Entre uma dívida que pode me impedir de registrar jogador e outra por causa da qual posso tomar uma penhora, eu opto em pagar a que me impede de registrar jogador, neste momento. Não que a outra não seja importante. Mas é essa gestão do dia dia que eu faço. O jurídico diz se a dívida está em fase final. São muitas horas de trabalho, vendo o que é mais arriscado. É gestão dos riscos do passivo. Isso não significa que vamos deixar de ter dificuldade. O cara do lado de lá não pode achar que o Fluminense, da noite para o dia, está 100% recuperado.
Em relação à busca pelo patrocinador master, a impressão que temos é de que estagnou. Foi isso mesmo?
Não é estagnado. Para ser muito honesto, no momento estamos conversando com seis empresas. Não falo só de master não, do uniforme em geral. Mas vocês precisam compreender que isso virou uma obsessão (para a opinião pública). Quando o Goiás anunciou patrocínio master da Philco… Pô, os caras estão pagando R$ 2 milhões por ano. É R$ 200 mil por mês. Não vale para nós. Porque o que estamos estimando de patrocínio master hoje é R$ 12 milhões por ano. Isso é R$ 1 milhão por mês. Não é 10% da receita do clube. Então não tem nenhuma necessidade (de correr). Devemos ter novidade no brasileiro, mas nas outras propriedades. Com relação ao master, a gente esta prospectando, dizendo qual é o valor mínimo e máximo que a gente aceita. Não ter um patrocinador master no momento não nos aflige. Porque já foi a receita mais importante de um clube. Hoje, é uma boa receita. Mas temos conseguido sobreviver sem ela porque a gente não está aceitando um valor menor do que vale a camisa do Fluminense.
Você diria que, hoje, não vender um jogador te aflige mais do que não ter um patrocinador master?
Óbvio.
Fonte: O Globo