Faz um ano que o futebol brasileiro tenta entender por que é tão difícil parar o Flamengo de Jorge Jesus. O impacto produzido aqui pelo trabalho do português num elenco de primeira linha, inacessível para a realidade econômica dos rivais, mistura qualidade técnica, intensidade sem a bola e organização para atacar ? um repertório ofensivo amplo, de mobilidade rara.
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Antes do jogo com o Volta Redonda, o lateral Éverton Silva, do Boavista, referia-se a estas virtudes quando dizia, num áudio vazado na internet, ser “impossível respirar” e que “tudo é ensaiado”. Chegou a citar códigos como “pular uma casa” ou “entrar na movimentação do 3”. Jamais se saberá ao certo o que são. Certamente, são expressões combinadas em treino, na intimidade do Ninho do Urubu. No entanto, no jogo com o Volta Redonda, cada um dos dois gols permitiu uma reflexão sobre este Flamengo. O primeiro dá margem a especulações sobre “entrar na movimentação do 3”. O segundo mostra o quanto é difícil lídar com o repertório ofensivo do time de Jesus.
No primeiro gol, a defesa do Volta Redonda defende poucos metros à frente de sua área. Os dois zagueiros cuidam de Bruno Henrique e Gabigol. Até que a mobilidade do Flamengo se mostra fatal a uma linha defensiva que se quebra graças ao hábito de fazer perseguições que ainda existe no Brasil.
Na imagem acima, Éverton Ribeiro já iniciou seu movimento do lado direito para o centro e o lateral-esquerdo Luiz Paulo já se mostra indeciso entre guardar posição ou seguir o meia rubro-negro. A linha já se quebrou. Mas o espaço para o gol do Flamengo se abre mesmo quando Filipe Luís dá o passe em diagonal, na direção de Gabigol. Ao ver a bola se aproximar de Éverton Ribeiro, que nem chega a tocar nela, o zagueiro Heitor abandona Bruno Henrique e corre para marcá-lo. Um movimento fatal. A “posição do 3” fica vazia para a penetração de Bruno Henrique, que faz o gol após o passe preciso de Gabigol.
É impossível dizer que Éverton Silva se referia a isso no áudio. Tudo pode ser apenas uma coincidência, apimentada pelo fato de que Heitor usa a camisa 3. O fato é que, ao jogar com dois atacantes, algo que também se tornara raro no Brasil, o Flamengo impôs dúvidas a muitas defesas. As movimentações em diagonal de Gabigol e Bruno Henrique criam, muitas vezes, o espaço para Arrascaeta ou Éverton Ribeiro fazerem tais infiltrações. No lance do gol contra o Volta Redonda, quem infiltrou foi o próprio Bruno Henrique. Da mesma forma, ao saírem do lado do campo e buscarem o centro, entre as linhas de marcação dos rivais, Éverton e Arrascaeta permitem aproximações para trocas de passes e indecisões nas defesas adversárias.
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Não é fácil se manter atrás contra este Flamengo. Um time que pressiona tão bem no campo ofensivo é capaz de fazer o jogo não sair das imediações da área inimiga, tornando quase insustentável a tarefa de resistir. A outra opção, tentar pressionar mais à frente, já rendeu alguns frutos a times que conseguiram tornar a saída de jogo do Flamengo desconfortável. Mas tampouco é uma alternativa segura.
No segundo gol sobre o Volta Redonda (imagem acima), o adversário, já em desvantagem, tentou adiantar a marcação. Mas aí o jogo de aproximações e a qualidade técnica do time permitiram vencer a linha de pressão. Uma combinação rápida entre Arão e Gérson, com belo toque de calcanhar deste último, achou Gabigol, que recuara alguns metros para se posicionar entre as linhas do Volta Redonda. E aqui vale um desconto: o time do Sul-Fluminense deixou enorme espaço, já que seus defensores não avançaram junto com o restante do time. E no espaço, o ataque do Flamengo é dificílimo de marcar.
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Fonte: O Globo