O colapso financeiro gerado pela pandemia do coronavírus não deixa ilesas figuras que, originariamente, pertencem a outro universo: o futebol. O time de jogadores que investe no mercado de ações é crescente. Assim, o momento exige deles um sangue frio típico de quem está prestes a bater um pênalti para evitar uma eliminação. Em jogo, neste caso, não está um troféu, mas, sim, os recursos acumulados ao longo da vida.

? Tenho vários amigos assustados. Eu fiquei também. Ninguém está nessa para perder. Todos queremos melhorar. Foi um baque, mas temos que pensar nas novas oportunidades ? relata o meio-campista Wesley, hoje no Avaí.

Março foi complicado. Foram seis circuit breakers ? interrupção dos trabalhos da bolsa de valores diante de quedas profundas ? em um intervalo de oito pregões. No linguajar do futebol, é como se alguém apagasse os refletores do estádio na tentativa de interromper uma humilhante goleada. Mesmo assim, o Ibovespa fechou o mês com queda acumulada de 29,9%. O índice não despencava assim em um só mês desde 1998.

Formado no Santos, Wesley resolveu entrar no mundo dos investimentos em 2012, quando voltou ao Brasil para jogar no Palmeiras, depois de passar duas temporadas no Werder Bremen (ALE). Após dica do empresário, ele entrou para um time com cada vez mais adeptos. A classe ganha bem, mas tem carreira curta. Fazer investimentos é uma alternativa para pensar no sustento futuro.

? Quem vem de origem pobre não tem herança. Para construir patrimônio e depois guardar dinheiro é difícil ? comenta o meia.

O volante Lucas Leiva (Lazio), o atacante Richarlison (Everton), o meia Moisés (ex-Palmeiras) e o zagueiro Wallace (ex-Flamengo) são alguns dos que investem.

Wesley não toma decisões sem conversar com a esposa. Mas ele e outros jogadores contam com aconselhamento para esses momentos caóticos. Há empresas especializadas que auxiliam na condução dos investimentos. E isso envolve não só aplicações financeiras, mas também gestão de imóveis e outros bens.

? Atendemos por volta de 50 jogadores, que atuam tanto no Brasil quanto no exterior. A ideia é usar melhor o recurso. O brasileiro está começando a ficar mais educado financeiramente. Isso vale também para os atletas ? diz Henning Sandtfoss, que há oito anos abriu a Redoma Capital.

Confiança em meio ao caos

A relação demanda muita confiança entre as partes. No caso da Redoma, a atuação envolve, por exemplo, resolver pendências burocráticas quando um jogador muda de cidade ou país. Até arrumar babá para as crianças está na lista.

Em geral, os investimentos dos jogadores se concentram em renda fixa, uma opção mais conservadora. Do ponto de vista de quem dá conselhos, a proposta é evitar pânico diante do colapso dos índices.

? O mais comum foi dar explicação. Os clientes queriam resgatar o investimento desde o primeiro circuit breaker. Mas eu digo: se tiver estômago ainda, vamos aumentar um pouco, porque vai pegar a volta (subida). Conto que, na prática, ele não está perdendo nada. Olhar o extrato dá a impressão de que está perdendo dinheiro. Mas ele só vai perder quando ele realizar a retirada. A gente tenta falar em perspectiva de longo prazo ? conta Henning.

Planejando mais cinco anos de carreira dentro de campo, Wesley se diz um investidor equilibrado. Na crise atual, aumentou posição em renda variável: foi de 10% para 20% das aplicações na configuração mais “ousada?.

? Nunca tomei uma pancada. Eu sou moderado. Coloco um pouquinho de pimenta às vezes, mas não é uma situação vá me prejudicar tanto ? comenta ele, que se espelha no ex-zagueiro Paulo André, atualmente diretor de futebol do Athletico:

? Eu brinco que ele é pão-duro, mas ele pensa bastante antes de fazer algo. Eu o tenho como referência.